21 de dez. de 2012

O Fim do Mundo (2)

andre_mansur_fim_do_mundoEstava tudo bem planejado, o cronograma definido para o mega evento.

O Calendário Maia estava bem aferido, testado que foi pela NASA que comparou os átomos de carbono e os isótopos 14, e dava uma margem de erro de 0,004 nano segundos. Em vários países do Hemisfério Norte cidadãos abastados construíram abrigos subterrâneos enganados pela falsa propaganda que garantia a sobrevivência em caso do mundo acabar (o que é uma asneira, pois acabando o mundo acabam também os abrigos subterrâneos, mas como novos ricos geralmente são idiotas e compram qualquer merda, um monte deles comprou abrigos subterrâneos). Apóstolos, super-evangelistas, mega-pastores, e outros picaretas do tipo, encheram o bucho de dinheiro fácil vendendo passes de salvação para os incautos de sempre.

Após uma ferrenha concorrência, a cidade do Rio de Janeiro foi escolhida para sediar o Grande Impacto que daria início ao fim-do-mundo. A Prefeitura do Rio, com apoio do Governo do Estado e do Governo Federal (afinal alianças políticas servem para essas coisas) construiu três fim-do-mundródomos, porque várias pendengas judicias impetradas por diferentes grupos de interesse, determinavam que o evento deveria acontecer em locais diferentes.

Setores ligados à FIFA e à CNBB (um acordão envolvendo a bancada evangélica em off) impetraram mandato de segurança para que o evento acontecesse no novíssimo Maracanã (cujo projeto final foi aprovado pela Sagrada Comissão Ecumênica da Volta de Jesus); todavia, outros mandatos de segurança e liminares determinavam que seria em frente ao Copacabana Palace onde ficariam hospedadas as autoridades mundiais que celebrariam o acordo internacional do fim-do-mundo, perdoando as dívidas externas de todos os países, inclusive a dos EUA, uma vez que sendo o fim-do-mundo ninguém ia pagar mesmo e se pagassem, os que recebessem não teriam onde gastar; esse era o Projeto Original da Prefeitura que contaria com o patrocínio exclusivo da Petrobrás, do Eike Batista e do Bradesco (o Banco  oficial do Fim-do-Mudo). 

Um terceiro grupo, liderado pelo lobby das Escolas de Samba exigia que o evento acontecesse na Praça da Apoteose após o desfile da União Geral de Grêmios Recreativos e Escolas de Samba do Rio de Janeiro (um mega desfile juntando todas as escolas de todos os grupos); esse grupo tinha o apoio de vários ministros do STF, que alegando o excesso de trabalho devido ao Mensalão, não pode julgar tudo que estava rolando sobre o fim-do-mundo; assim até dia 15 de dezembro, não estava judicialmente decidido o local do impacto.

Para não perder a oportunidade política, a Presidenta da República consultou o Ministério da Ciência e Tecnologia sobre a possibilidade de se conseguir mais dois asteroides, de forma que o evento aconteceria nos três locais  simultaneamente, e seria assim um evento popular onde todos poderiam participar; a Presidenta assinou Medida Provisória definindo recursos para que o INPE providenciasse dois asteroides em caráter de urgência urgentíssima em benefício do interesse público. Todavia, graças a rápida manobra política, a Oposição conseguiu  bloquear a MP no Congresso alegando que os recursos extraordinários fariam falta aos setores de saúde e educação do país; para garantir, os Partidos de Oposição, com a cobertura da mídia empresarial, impetraram mandato de segurança no STF, apesar das explicações do Ministro Presidente do Egrégio Tribunal informar que o Mandato só poderia ser apreciado pela Casa duas semanas ou três após o fim-do-mundo.

Fora do Brasil, na ONU, com a Assembleia Geral reunida, povos de outras culturas e religiões contestavam, através de seus diplomatas, a realização do fim-do-mundo em um país cristão, uma vez que ninguém além dos cristãos esperam a volta de Jesus, e que isso não poderia ser imposto; assim, o mundo não poderia acabar com a volta de Jesus pois seria uma afronta aos povos de outros credos. O representante dos EUA informou que seu país não vai tolerar ingerências terroristas no fim-do-mundo e já colocou todo seu aparato militar em prontidão de alerta laranja, pronto para invadir qualquer país que se oponha ao fim-do-mundo na forma que foi definida, a fim de garantir a liberdade e a democracia mundial mesmo no fim-do-mundo.

Grupos ativistas de todas as cores, do mundo inteiro, especialmente ambientalistas e promotores dos direitos humanos, decidiram realizar um fim-do-mundo alternativo, que aconteceria no Aterro do Flamengo, com o slogan “Um outro fim-do-mundo é possível!”, determinando que o mundo terminaria não por um impacto de asteroide, que danificaria o meio ambiente, mas de forma bem natural, convocando a humanidade inteira e todos os animais a darem um tremendo peido coletivo à hora marcada, alterando rapidamente a atmosfera para o mundo acabar pela falta momentânea de oxigênio, o qual seria rapidamente reposto pelos vegetais em menos de dois séculos através da fotossíntese. O Peido do Novo Mundo foi estampado em camisetas, bandeiras, cartazes… e foram distribuídos à toda humanidade feijões pretos, repolhos e bata-doce, a fim de garantir o evento.

Apesar desses contratempos todos, o Governo Brasileiro garantiu o fim-do-mundo oficial no dia e hora marcada.

De fato, à hora prevista, no dia 21 de dezembro, três enormes asteroides entram na atmosfera da terra, mas se desintegram em poucos segundos, dando como resultado um miserável chuvisco de meteoros, que mal foi visto devido à intensa luz do sol. As autoridades no Copacabana Palace mantiveram o sorriso cínico como se nada realmente tivesse acontecido (e realmente, nada aconteceu). 

No Maracanã, para disfarçar, organizou-se um joguinho amistoso entre Corinthians e Flamengo com as bênçãos do Papa  (que daria a Bênção Final Urbi et Orbi no centro do gramado); enquanto isso, na Praça da Apoteose, terminado o desfile, e nada tendo acontecido, uma briga entre as baterias animou o pessoal sendo que até o momento em que escrevo essas linhas, o pau continua comendo solto por lá.

No Aterro do Flamengo, todavia, o Fim-do-Mundo alternativo também não deu certo: não conseguiram sincronizar o horário do Grande Peido Mundial, de forma que uns peidaram muito cedo, outros mais tarde mas isso não foi suficiente, e ainda tem gente peidando pelo mundo todo…

A Globo, pouco depois do fracasso dos asteroides, colocou no ar o Boal, com as chamadas para o Big Brother Brasil e o Jornal Hoje informou que a CIA suspeita que terroristas albaneses conseguiram danificar o asteroide oficial quando ainda estava por trás da Lua, por isso ele falhou, mas não emitiu nenhum parecer sobre a falha dos dois asteroides brasileiros  extras. Seja como for, uma frota norte-americana estacionou no litoral da Albânia, e logo em seguida o Iran anunciou seu apoio ao valente povo albanês.

No elevador do Copacabana Palace, a Primeira Ministra Alemã comenta com o Rei da Suécia: “Eu bem avisei àquela senhora Dilma que encomendar asteroides chineses não era a coisa mais adequada, mas eles ganharam a concorrência e deu no que deu!”.

===/===

3 de dez. de 2012

Quando não havia o videoteipe, nem o Jô.

Indio da TupyNo final dos anos 50 e início dos 60 do século passado, a TV brasileira engatinhava. Não havia videoteipe, tudo era feito “ao vivo e em preto&branco” e a improvisação era a grande arte! Não havia a baixaria dos programas religiosos, claro.

Lembro que as propagandas eram feitas em estúdio, com uma moça, chamada garota propaganda, apresentando os produtos. Essas moças pagavam muito mico: ela mostrava o novíssimo liquidificador Arno e picava banana, maçã, colocava leite, mostrava como era “fácil fazer uma deliciosa vitamina de frutas”; então girava o botão para ligar o incrível equipamento e nada acontecia! Ela dava um sorriso, girava o botão de novo. Sempre sorrindo, ela tenta novamente, nada! então aparece um sujeito por trás da cena e liga alguma coisa na tomada, era o liquidificador que não estava “plugado”. E então o aparelho começava a funcionar e a tampa saia fora e a pobre “garota propaganda” tomava um banho de vitamina! A imagem saia do ar, entrava o indiozinho da Tupi. Eu me dobrava de rir! Outra vez, a moça estava mostrando um incrível sofá-cama, grande novidade. Ela vai mostrar como é fácil armar a cama, ergue o assento do sofá, o dito cujo escorrega para trás, derruba a parede do cenário, uma confusão danada, novamente a imagem sai do ar e aparece o indiozinho…

Capitão 7

A garotada se amarrava nas Aventuras do Capitão 7, que passava na TV Record de São Paulo, o Canal 7 , onde também havia um programa que a gente curtia muito às 6 horas da tarde: Pullman Junior e depois a Turma dos 7. O Capitão 7 era o nosso super-herói, e fazia sucesso ao lado do Vigilante Rodoviário.  Legal mesmo era o Pullman Junior: crianças se inscreviam para participar, e ficavam lá comendo bolo Pullman, tomando Guaraná Antártica e vendo desenho animado. Uma vez eu participei junto com meu irmão Ricardo. Mamãe ficou dias tentando pelo telefone a nossa inscrição (telefone naquela época era mais complicado que celular da TIM). Conseguiu, era um programa especial de carnaval e fomos fantasiados de palhaço, eu e o Ricardo (nós havíamos ganho um prémio de originalidade no baile infantil naqueles dias, e mamãe estava orgulhosa das fantasias que ela mesma havia confeccionado!).

Chegamos na TV Record, que ficava pertinho do longínquo Aeroporto de Congonhas, e era simplesmente um conjunto de barracões cheios de divisões internas (os funcionários chamavam de estúdios!). Logo na entrada, um saguão, estavam três senhoras sentadas conversando. Reconheci uma delas rapidamente, era a esposa do Palhaço Pimentinha, que era companheiro do Arrelia, no Circo do Arrelia. Essa senhora era uma espécie de faz tudo: atuava no circo, fazia às vezes de garota propaganda, fazia número em programas que tinham de apresentar pequenos auditórios, etc. Ela olhou para mim e disse: “Olha só, se ele fosse magrinho, seria igual ao Pimentinha!” e todo mundo caiu na gargalhada, eu fiquei vermelho de vergonha! Fomos para o estúdio do Pullman Junior e foi quando descobri que era apenas um canto, onde haviam algumas mesas, um monte de criança sentada nas mesas comendo bolo; a gente mal podia ver o desenho animado, porque a televisão ficava por trás. Havia uma menina que apresentava o programa naquele tempo, acho que era a Débora Duarte!!! ela veio me entrevistar e eu fiquei todo orgulhoso: eu estava falando com a Débora, a menina que perturbava meus colegas de ginásio!!! eu tinha 11 anos!

TURMA DOS SETEFoi ai que alguém da TV Record me achou! Havia um programa muito legal, chamado Turma dos Sete, as aventuras de sete crianças, amigos e vizinhos. Um desse personagens se chamava Bolão e era gordinho. O menino que fazia papel de Bolão estava já muito “velho” para o elenco e estavam procurando outros. O sujeito que se apresentou como Produtor da Record gostou de mim… minha mãe, claro, ficou toda cheia de si, e lá foi o Luiz Caetano fazer semanas de testes, decorar texto, até que finalmente eu fui ao ar!!! Putz! Minha mãe passou dias no telefone avisando todos os parentes, inclusive os primos de segundo, terceiro e quarto grau, as vizinhas das cunhadas das primas, etc. que o Luiz Caetano ia estrear na TV no dia tal, ia ser o Bolão da Turma dos Sete, e claro, “ele tem talento, eu sempre soube disso, está muito bem e o diretor gosta muito dele!”. Pobre mamãe! como toda senhora jovem pequeno-burguesa vivia das fantasias do mercado…

Dona Renata, mamãe, deve ter elevado muito o Ibope da Turma do Sete naquele dia, se isso já existisse. Naquele tempo não tinha FACEBOOK, nem Twitter, então não tinha como “compartilhar”, o negócio era telefonar pra todo mundo mesmo. Não tinha videoteipe. A gente entrava no ar e a coisa tinha de rolar na marra! se saísse errado, a gente tinha de improvisar… era divertido!

Durou pouco meu tempo de TV. Meu pai cismou, no que foi plenamente apoiado pelo Diretor do Colégio Nossa Senhora da Glória, o Irmão Expedito Leão (Marista), que aquele negócio de trabalhar na TV e estudar não dava certo. E com seu jeito de pai mansinho, ele convenceu minha mãe e eu simplesmente tive de deixar o programa. Acho que fiz uns três programas, estava em fase de teste ainda.

Por isso é que o Lima Duarte, o Francisco Cuoco e o Tarcísio Meira fizeram sucesso! Meu pai bloqueou minha carreira na TV!!! mas tive meus dias de glória na telinha! e nem precisei escrever livro, virar presidente de qualquer coisa, nem pagar para aparecer no Jô para isso! E ainda ganhei uma graninha, que meu pai usou para comprar minha bicicleta Caloi aro 24, com a qual eu finalmente ganhei do Marcelo (que tinha uma Monark aro 24) nas corridas de bicicleta que a criançada da vizinhança fazia na Jackson de Figueiredo, bairro da Aclimação, São Paulo.

Se naquela época tivesse o FACEBOOK eu teria compartilhado com amigos, grupos, páginas, etc.  É o modesto charme da burguesia!  e vamo que vamo!

===/===

30 de nov. de 2012

Comunidade ou clientela?

Rev. FulanoMuitas vezes aparecem pessoas visitando a São Paulo Apóstolo, e travam comigo ou com alguém um diálogo assim:

“_ Esta igreja aqui é a mesma do Rev. Fulano, lá de (cidade)? a gente é de lá, frequenta lá. É que disseram que é a mesma!”

“_ Sim, é a mesma Igreja, somos parte da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil”

“_ Não sei se é essa, mas é a mesma coisa né? porque a gente gosta muito do Rev. Fulano, sabe, né, ele é muito bom, faz muita coisa boa!”

“_ Sim, eu sei…”

“_ Mas é tudo igual à igreja de lá, né?”

“_ Vocês são Episcopais Anglicanos?”

“_ É, acho que é isso, Anglicana, né? mas é a igreja do Rev. Fulano, em (cidade). A gente gosta muito dele, sabe? ele fala bonito, muito espiritual, e faz muita coisa boa pros outros…”

“_ Sei…”

“_ Aqui não tem muita gente, né? é que lá todo mundo gosta do Rev. Fulano… muita gente vai lá… ele é muito conhecido, né? Inclusive ele casou o Vice Síndico do meu prédio e batizou o filho da amiga da minha prima de segundo grau, foi assim que a gente conheceu ele.”

“_ Sei… mas vocês são bem vindos, em nome do Senhor Jesus Cristo!”

“_ Como é mesmo o seu nome? é que a gente quer telefonar lá pra Igreja do Rev. Fulano para ter certeza que é a mesma coisa; é que não é igual, sabe? lá não tem aquela coisa ali na mesona…” (ou “não tem vela”, ou “tem muito mais vela”, ou “tem a foto da avó do Rev. Fulano com ele no colo quando bebezinho, no lado do altar” – coisas desse tipo).

Já ouvi isso em outras comunidades onde trabalhei, e mesmo no meio ecumênico, gente que se refere à uma Igreja ou uma Denominação se referindo a um determinado pastor (vi isso em diferentes denominações).

Uma das coisas que sempre peço a Deus em meu ministério é que a Paróquia onde sirvo não venha a ser conhecida como a Igreja do Rev. Caetano, para que eu não peque por Soberba ou Orgulho. Eu pretendo servir ao Povo de Deus em Cristo, na comunidade episcopaliana onde esteja servindo e exercendo meu ministério, em comunhão com o Bispo Diocesano, e não a uma clientela que me idolatre! Eu tento sempre apontar ao Senhor, não a mim mesmo.

É o Espírito Santo de Deus quem deve fazer a Igreja, não a minha simpatia pessoal ou as sugestões do meu personal promoter, ou a minha enorme capacidade de bajular quem aparenta ser “pessoa de bem” (bens!).

É claro que as pessoas têm no pastor sua primeira referência, especialmente se são novos na comunidade. Mas o convívio com a comunidade acolhedora, a pregação, o ensino e – principalmente o não ter pressa para confirmar ou receber formalmente em comunhão uma pessoa a fim de mostrar crescimento estatístico – deve fazer aos poucos  que as pessoas se identifiquem com a Comunidade, e com a denominação. 

Que Deus me ajude! e que Deus salve a Igreja dos que se autopromovem usurpando o nome do Senhor! daqueles que, ao divulgarem a si mesmos, pensam estar divulgando a Igreja e o Evangelho, nas relações pessoais e, principalmente na mídia.

Como disse o Apóstolo São Paulo, “ […] de modo que nem o que planta nem o que rega são alguma coisa, mas unicamente Deus, que efetua o crescimento. (1. Cor 3.7)

===/===

26 de out. de 2012

Propostas em favor de “minorias oprimidas”…

Uma vez que a nossa sociedade é repleta de políticas afirmativas, quotas e bolsas por conta do Estado, e que o politicamente correto é hoje a ditadura da mediocridade, me atrevo a apresentar algumas sugestões de políticas afirmativas em defesa de alguns grupos sociais ainda não privilegiados, já que este é o país dos direitos sem deveres. 

1. Quota para alun@s obes@s no Ensino Superior:  veja bem, o sujeito/a sujeita é gordinh@, estuda em escola pública, mas é branc@, não tem afro-antepassad@, e por isso – por ser gordinh@ – disputa vestibular em desvantagem flagrante diante dos saudáveis mauricinhos e patricinhas que frequentam academias. Veja só: o/a infeliz  gordinh@ tem de subir e descer escadas no colégio, o que no seu caso, o/a faz chegar mais cansad@ que @s demais na sala de aula, geralmente com dor nas pernas e no pé, e isso afeta seu aprendizado, pois já sofreu um estresse antes de começar a aula. Considere-se que normalmente gordinh@s caminham mais devagar e por isso acabam chegando atrasad@s à escola devido a terem de caminhar desde o ponto de ônibus… Portanto, nada mais justo que se ofereça uma quota para gordinh@s a fim de que possam cursar uma faculdade e disputarem o mercado de trabalho de camelô com os demais estudantes magr@s. E é muito simples caracterizar um/uma gord@: basta olhar! Não precisa trazer documento, árvore genealógica, retrato editado no Photoshop, etc. O/A funcionári@ que receber a inscrição, olha bem o/a candidat@ e, como tem fé pública, atesta imediatamente que o/a candidat@ é gord@.

2. Assentos especiais para hemorreicos/hemorriecas: isso é importantíssimo, pois é assunto de saúde pública! Quem tem hemorroidas sabe (não é meu caso, mas eu penso muito n@s coitadinh@s). O/a infeliz vai ao cinema, teatro, restaurante, pega ônibus, taxi, metrô, trem urbano, viaja de avião, vai na escola, e mais uma porrada de coisas, onde tem de se sentar (claro que no caso do transporte público, é preciso que ele/ela tenha sorte em achar um banco vazio). E então, sentar-se é um suplício! Por isso, tudo que seja local onde hajam assentos, deve haver um percentual de assentos especiais para os infelizes, com um vazio no meio a fim de possibilitar a esses/essas coitad@s um conforto. Ainda não resolvi como o/a sujeit@ prova que tem direito a usar o tal assento e exigir que o/a adolescente boca-aberta, que adora usar os assentos reservados, desocupe o acento furado reservado ao/à portador(a) de hemorroidas (que seria politicamente mais correto chamar de trabalhador(a) com necessidades especiais para sentar-se, a fim de não ser pejorativo). Não será necessário desenvolver nenhuma tecnologia especial, basta equipar os locais com uma percentagem de cadeiras cujo assento seja uma tábua de privada, que é baratinho no mercado (não precisa ser almofadado, porque ai já seria um luxo e o governo não vai subsidiar isso!). Atenção: alguns locais públicos já reservam assentos especiais para obes@s, então tem de lembrar que alguns obes@s são também trabalhadores(as) com necessidades especiais para sentar-se apesar da bunda grande.

3. Faixa exclusiva para motoboy/motogirl em todas as ruas e avenidas e vielas: é realmente aterrador ver os/as trabalhadores(as) motoboys/girls oprimid@s pelo transito e pel@s desalmad@s motoristas que insistem em não dar brecha para eles/elas passarem, obrigando-os/as a sofrerem colisões nas solas dos pés contra espelhos retrovisores externos, por exemplo. É preciso lembrar que motoboy/girl ganha por produção, por isso, não pode perder seu precioso tempo em engarrafamentos, nem perder sua concentração em chegar logo por causa de pedestres mal intencionad@s que surgem por trás de carros e ônibus, inclusive nas faixas de pedestre com sinal aberto para os tais. Com a faixa exclusiva em qualquer via pública, os motoboys/girls não precisariam machucar os pés com retrovisores, nem fazerem uma ginástica danada para passar entre veículos parados em congestionamentos. Veja bem: qualquer pedestre tem faixa exclusiva que se chama calçada; por que os motoboys/girls não têm sua faixa exclusiva? isso é uma opressão burguesa contra os/as pobres rapazes/rapazas de capacete em duas rodas.

4. Bolsa-Família para solteir@s, solitári@s e casais estéreis: nem preciso argumentar muito neste caso, pois a tal Bolsa-Família oferecida apenas a quem tenha filh@s menores é um insulto ao princípio que tod@s os/as cidadãos(ãs) são iguais perante o Estado. No que se refere às mulheres, principalmente, pois uma mãe-solteira, só por ser mãe, tem direito à bolsa família. Cabe o adendo da pergunta se pai solteiro tem o mesmo direito (embora não seja politicamente correto exigir-se direitos especiais para pessoas do gênero masculino; a menos que seja uma homossexual ativa ou devo dizer lésbica ativa? não é ofensivo?).
Estas são algumas propostas… tenho mais…

---- IMPORTANTE----
Observações sobre algumas questões semânticas que podem ser levantadas  ao ler-se  este artigo. Para evitar que os/as politicamente corret@s fiquem mais enfurecid@s que de costume, apresento a chave hermenêutica para certas palavras e expressões utilizadas no texto acima:

a) quando falo em ditadura da mediocridade, não é pejorativo. Medíocre significa median@, médi@, ou seja dentro do padrão da maioria. O/A politicamente corret@, exatamente por considerar-se corret@ (os/as diferentes são, então, incorret@s) é uma ditadura, ou seja, um totalitarismo.
b) bunda: no Brasil não é palavrão (baixo calão), mas em Portugal sim. Portugueses/as politicamente correct@s, por favor, lembrem-se que falo brasileiro.
c) mãe-solteira refere-se à mulher que tenha filhos e não é casada nem vive com um companheiro (assumindo ou não a paternidade); vale inclusive para aquelas adeptas da produção independente. Afinal, são solteiras. Isso não é pejorativo. Mas talvez fosse melhor, ao invés de mãe-solteira, referir-se às tais como “mulher emancipada que tenha prole”.  Não sei dizer se, no caso, prole seria politicamente correto. Talvez fosse melhor dizer “mulher emancipada que reproduziu parte de seu material genético com masculino oculto”.
d) se você é politicamente corret@ e ficou irritad@ com este artigo, então atingi meu objetivo.

Note que estou sendo politicamente correto ao ser idiotamente sincero.
===/===

3 de out. de 2012

Unidade e Diversidade, a nossa Identidade Episcopaliana

S. Pedro e São Paulo: A Igreja Judáica e a Igreja Gentílica se abraçam!Uma dificuldade que as pessoas hoje têm de compreender o sentido de unidade da Igreja de Cristo deve-se ao fato de haverem muitas denominações cristãs, diferentes Igrejas. Entretanto, essa diversidade é salutar!
A gente precisa entender bem essa questão da “divisão” da Igreja. Não é verdade que a Igreja Primitiva era uma coisa só. Não era! Havia uma variedade na forma de organização, na teologia em construção e na liturgia.
Desde do início da expansão missionária a partir da Igreja de Antioquia, que envia Paulo e Barnabé em Missão por ordem do Espírito Santo (cf. Atos 13.1-3), o cristianismo começou a dialogar com culturas e povos diferentes daquele ambiente nativo dos primeiros apóstolos.  Nesse sentido, o Apóstolo Paulo logo compreendeu que a grandeza do Evangelho não se limitava aos preceitos do judaísmo, e que o Evangelho é de fato uma Boa Nova para todos os povos. A expansão do Evangelho entre os povos pagãos do Império Romano, especialmente no ambiente marcado pelo helenismo, obrigou a Igreja em Jerusalém rever suas posições em relação às práticas judaicas; tal revisão aconteceu no que chamamos de Concílio de Jerusalém, narrado em Atos dos Apóstolos (15.1-33), provocada pela própria Igreja de Antioquia, a grande igreja missionária que, movida pelo Espírito Santo, deu início à evangelização do mundo gentílico: as comunidades que surgem a partir do movimento de Antioquia já não eram formadas apenas por pessoas de tradição judaica, mas também por gentias, ou seja, não judias.

Assim, cerca de 40 anos após a Ressurreição de Jesus já haviam “duas igrejas”: a Igreja de Jerusalém e suas comunidades filhas, de forte orientação judaica, que se confundia inclusive com as sinagogas; e a  Igreja Gentílica, cujos procedimentos, especialmente em relação aos usos e costumes, eram bem distintos. Todavia, não eram “duas igrejas” mas uma única Igreja, com características diferentes. Por volta do ano 90 uma terceira Igreja vem dar origem à literatura Joanina, com outro enfoque e distinto dos Evangelhos Sinóticos.
Nem sempre o convívio entre as duas (ou três) correntes era pacífico. Haviam, naturalmente, escaramuças, mas o senso de unidade era assegurado pela relação afetiva e companheira entre os apóstolos (não só os 12, mas todos aqueles que pregavam o Evangelho sendo testemunhas da Ressurreição). Varias fontes não bíblicas, mas reconhecidamente validadas pela Historiografia, relatam o surgimento de comunidades cristãs fora do Império Romano, no interior da Ásia e até na Índia. Isso amplia muito nossa percepção da diversidade da Igreja ao final do primeiro século cristão.
Ao final do séc. III e início do IV, a Igreja estava organizada, pelo menos dentro do Império Romano, com as ordens clericais e a divisão territorial das dioceses (uma unidade territorial do Império), sendo que os Bispos das cidades maiores eram chamados Arcebispos ou Metropolitas, e a eles se subordinavam, de forma afetiva e pastoral os bispos das cidades menores circunvizinhas; em caso de discordância doutrinária, por exemplo, os Metropolitas serviam como árbitros e convocavam concílios regionais para acertar o passo.

A Igreja do Ocidente
Com a derrocada do Império no ocidente, a Igreja se tornou a única instituição estável dentro do caos social e político que se criou. Os Metropolitas ganharam força política e o Metropolita da antiga Capital Imperial, Roma, acabou se tornando o mais importante. A agregação hierárquica a partir do Bispo de Roma acabou se consolidando em meados do século VI, e a Igreja Ocidental foi se tornando cada vez mais monolítica e padronizada. Vários concílios foram consolidando as formas estruturais e o corpo doutrinário, fixando a identidade da Igreja Latina, que hoje conhecemos como Igreja Católica Romana.
No Oriente, onde ainda sobrevivia o Império, a Igreja se manteve dentro do antigo padrão dos Patriarcados organizados em arquidioceses e dioceses interdependentes, mas distintos. O Patriarca Romano se tornou, todavia, o Chefe absoluto da Igreja Ocidental assumindo a Igreja o papel político de polo unificador do Ocidente retalhado em feudos.
Todavia, no Ocidente, essa concentração hierárquica vertical e o corpo doutrinário fechado, não foi bem acolhida entre os diferentes povos que então ocupavam, de forma autônoma, o antigo território imperial. No seio das dioceses havia o descontentamento e movimentos de defesa da autonomia, bem como diferentes formas de pensar teológico, nem sempre fiéis à dogmática imposta.
Assim, por exemplo, a antiga Igreja dos Celtas, na Grande Bretanha, submeteu-se sob a força dos exércitos saxões ao Bispo de Roma, mas manteve em seus porões sua antiga tradição que provinha da Igreja do Oriente, mesclada com a cosmovisão da Antiga Religião. O mesmo aconteceu entre os povos da Gália (hoje parte da França), e no interior da Europa Central, que ao contrário dos eslavos a nordeste e sudeste, não foram evangelizados pelos Orientais (essa a origem da Igreja Ortodoxa Russa, por exemplo).
No decorrer da Idade Média houveram muitos movimentos de reforma da Igreja Ocidental. A Reforma do século XVI foi a que obteve maior êxito, criando novas formas de ser Igreja: a Igreja Evangélica (alemã) e a Igreja Reformada (suíça). É preciso ter claro que tais Igrejas não saíram da comunhão com Roma, mas foram excomungadas por Roma, criando assim a divisão que perdura até hoje no Ocidente.
Todavia, as diferentes Igrejas que, a partir dai, surgiram, de cunho nacional e/ou étnico, sempre tiveram a consciência de serem partes da Igreja Una, Santa, Católica(no sentido de ser de todo o mundo = ecumênica = oikomene)  e Apostólica de Jesus Cristo.

A origem da Igreja Episcopal
Quando, por razões de Estado, a Igreja da Inglaterra se torna autônoma em relação ao Papado, o processo de sua reorganização só se consolida no reinado de Elizabete I, formando-se assim a Igreja Nacional e Estatal que é, até hoje, a Church of England, acolhendo em seu seio as diversas tonalidades cristãs que existiam na Inglaterra, e ao mesmo tempo permitindo a organização de “Igrejas Livres” (sem a tutela do Estado), dando origem por exemplo, às Igrejas Congregacionais e às Igrejas Batistas.  Assim, se em seu início a Igreja da Inglaterra era muito marcada pela diversidade teológica, também preservou a riqueza litúrgica herdada da Igreja Latina, mas com as adaptações decorrentes da Tradição Celta que, de certa forma, veio do Oriente.
Na Escócia, a Igreja lá existente no século XVI era profundamente influenciada pelo calvinismo. Assim, organiza-se a Igreja Presbiteriana, que ficou sendo chamada de Igreja da Escócia (The Church of Scotland) . Todavia, nem todos aceitaram uma organização presbiteriana-congregacional e adotaram o episcopado histórico. Surge assim a Igreja Episcopal da Escócia (The Scottish Episcopal Church ou na língua original, Eaglais Easbaigeach na h-Alba), fortemente marcada pela teologia de Genebra, mas também buscando manter seu laço com o episcopado histórico, a exemplo da Igreja da Inglaterra.  Essa Igreja acaba adotando o Livro de Oração Comum escrito pelo Arcebispo Laud, o qual contém muito do Livro original elaborado pelo Arcebispo Cranmer e se afasta do modelo presbiteriano definitivamente. Todavia, ainda hoje na Escócia, as duas Igrejas Nacionais convivem e em muitas situações se articulam de forma conjunta.
Quando as Colônias Inglesas na América do Norte se tornam independentes, dando origem aos Estados Unidos da América, houve a preocupação de organizar-se uma Igreja Protestante Nacional, porém não dependente do Estado recém fundado. Naquele tempo, nos territórios coloniais, haviam diferentes denominações cristãs, traduzindo, de certa forma a mesma diversidade que existia na Metrópole. Houve um movimento procurando unir tais diferentes denominações em uma Igreja Nacional, e chegou-se ao consenso de adotar-se o modelo episcopal, mas manteve-se a liberdade dos grupos que não aceitaram unir-se à Igreja Nacional nascente.
Uma vez decidido que a Igreja Nacional teria um governo episcopal, necessário foi buscar a sagração de seu primeiro bispo de modo a garantir o Episcopado Histórico à nova Igreja. Naturalmente, isso foi buscado junto à Igreja da Inglaterra, mas devido às circunstâncias da Independência e o fato da Igreja inglesa ser estatal – isto é, vinculada à Coroa Britânica e ao Parlamento – os norte-americanos foram aconselhados a buscar o Episcopado Histórico entre os escoceses, sendo prontamente atendidos. Assim, o primeiro bispo da Igreja Protestante Episcopal dos Estados Unidos da América foi sagrado por bispos escoceses. Mas o segundo e o terceiro bispo já foram sagrados por ingleses, de forma que conseguiu-se manter uma certa unidade de comunhão apostólica entre a nova Igreja e a Igreja da antiga metrópole, e também com a Igreja escocesa. Ai está a gênese da Comunhão Anglicana, que se consolida no século XX!
Como a Igreja da Inglaterra, a Igreja Episcopal dos Estados Unidos nasceu com uma rica diversidade de formas e compreensões teológicas em seu seio, pois incorporou diversas tendências teológicas e litúrgicas, decorrentes do processo de união da qual nasceu. Sua unidade, como na Igreja da Inglaterra, é fundamentada no Livro de Oração Comum como manual litúrgico aberto (uma diversidade de formas cerimoniais para executar seu conteúdo ritual) e no pacto estabelecido no século XIX conhecido como Quadrilátero de Lambeth-Chicago; tal unidade garante a diversidade, que se torna parte de sua própria identidade.  Hoje essa Igreja Nacional (mas não estatal) dos Estados Unidos, é chamada The Episcopal Church (TEC).
Há várias formas de expressão dentro da Igreja Episcopal. Há os evangélicos, os evangelicais, os mais conservadores, os mais liberais, os mais litúrgicos, os teologicamente mais próximos de Roma, os mais próximos da Tradição Reformada e todas os possíveis entrelaçamentos dessas expressões. Sempre houveram tensões entre as diferentes ênfases; não é de hoje, e isso às vezes causou rupturas na unidade, através de cismas e formação de novas denominações. Outras vezes grupos se deligaram da Igreja mas decorrido o tempo de uma ou duas gerações retornaram… essa dinâmica é própria de uma Igreja que se recusa adotar posturas dogmáticas e depender de uma hierarquia absolutista verticalizada.
É essa Igreja que chegou ao Brasil em 1890, através de Morris e Kinsolving, dando origem à Igreja Protestante Episcopal no Rio Grande do Sul, depois Igreja Episcopal Brasileira, depois Igreja Episcopal do Brasil e agora Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, que é autóctone, autônoma e independente de sua Igreja Mãe (The Episcopal Church) ou de sua Igreja Avó (The Scottish Episcopal Church) ou ainda de sua Igreja Tia-Avó (The Church of England). É parte da Comunhão Anglicana; é uma Igreja Nacional que incorpora a cultura brasileira, e um espaço de diversidade e liberdade de pensamento que acolhe todas as pessoas que buscam a fé sem negar sua inteligência.

O momento presente da Igreja do Brasil
O mundanismo da pós modernidade vem invadindo a Igreja nos últimos tempos. O personalismo e o generalismo (em lugar da erudição e conhecimento) começa a minar o senso de identidade e de unidade da Igreja. As ênfases e tendências que garantem a diversidade começam a apresentar-se como “partidos” que disputam espaço e poder institucional.
Por estar inserida na sociedade brasileira, a Igreja sofre o mesmo fenômeno de “emburrecimento” das novas gerações decorrentes de um sistema escolar deficiente e organizado para não educar. Ao mesmo tempo, há um pragmatismo dogmático de formar mão-de-obra, como no mundo secular, sem conhecimento real, apenas prático.  A formação do clero se torna cada vez mais deficiente, seguindo o modelo da sociedade, e estuda-se a Teologia em termos acadêmicos, mas dissociada da prática pastoral e principalmente do estímulo à piedade pessoal. O estudo da Teologia passa a ser uma formalidade a ser cumprida; a piedade pessoal é descuidada em nome de uma pretensa secularização de “imersão no mundo”; o convívio vocacional não existe e assim os membros do clero se entendem como “colegas” e muitas vezes concorrentes entre si.
Há uma histérica necessidade de afirmar uma “identidade” anglo-isso, anglo-aquilo; o que eu vejo é muita gente se preocupando com detalhes da forma sem aprofundar conteúdo, uma coisa do tipo “garantir espaço”, “marcar território”.  Perde-se o senso da eclesiologia e da catolicidade da Igreja quando o Episcopado se torna alvo de disputas de poder institucional sem a perspectiva real do pastorado e do serviço – o péssimo estilo brasileiro de fazer política se torna comportamento na Igreja quando há a necessidade de uma eleição episcopal – o poder pelo poder!

Perspectivas de esperança
O Apóstolo Paulo, escrevendo aos Efésios, diz:
Como prisioneiro no Senhor, rogo-lhes que vivam de maneira digna da vocação que receberam. Sejam completamente humildes e dóceis, e sejam pacientes, suportando uns aos outros com amor. Façam todo o esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz. Há um só corpo e um só Espírito, assim como a esperança para a qual vocês foram chamados é uma só; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo,
um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos. E a cada um de nós foi concedida a graça, conforme a medida repartida por Cristo.
(Efésios 4:1-7 – Nova Versão Internacional)
É necessário suportar uns aos outros, não como tolerância, mas como suporte, sustentação uns dos outros.
É urgente retornarmos ao convívio da oração coletiva, do estudo da Bíblia e da partilha pastoral, não só nas comunidades, onde isso ainda acontece, mas entre o clero e as lideranças leigas.
É urgente que reestabeleçamos a formação teológica vinculada à formação pastoral e ao desenvolvimento da piedade e disciplina pessoal.
É urgente que deixemos a administração dos negócios financeiros e patrimoniais da Igreja nas mãos de pessoas realmente competentes e profissionais, de preferência leigos, e que a hierarquia e o clero se submetam às recomendações técnicas de saneamento econômico da Igreja. É urgente que nossos Bispos e o clero se dediquem mais ao Pastorado, à Missão, à Evangelização, ao Ensino e à Cura de almas que à administração institucional; que liderem o caminhar do Povo de Deus e não da instituição humana.
É fundamental que se invista em infraestrutura (comunidades locais e dioceses) que em estruturas (provinciais e diocesanas).
É fundamental o fortalecimento do laicato, não só nos serviços ministeriais, mas também como poder autônomo na Igreja, atuando como espaço crítico-reflexivo que possa ajudar o clero e o episcopado a perceber as tendências do mundo e, assim, produzirem a reflexão teológico-pastoral adequada aos desafios do tempo presente. Nesse sentido, o ministério dos Diáconos ganha um significado importantíssimo!
Tais buscas, se realmente começarem a acontecer, me darão a esperança que minha Igreja ainda está viva e consciente de sua dependência do Espírito Santo de Deus e subordinada em obediência ao Senhor Jesus Cristo.
[Nota: comentários com a devida correção de detalhes e imprecisões históricas ou de interpretação da história serão muito bem vindos, pois o artigo foi escrito sem uma pesquisa profunda, baseada apenas nos meus poucos conhecimentos adquiridos no decorrer dos anos]
===/===

22 de set. de 2012

O que está acontecendo na Igreja?

  drz19
Este artigo é resultado de uma reflexão que temos feito na Paróquia São Paulo Apóstolo, como companheiros de ministério e partilhado com algumas lideranças leigas da paróquia, no contexto do Clamor pela Igreja que a comunidade tem realizado dominicalmente desde o Pentecostes.  Trata-se de um texto pessoal de nossa exclusiva responsabilidade, e não reflete, necessariamente, o pensamento da comunidade paroquial, da Diocese Anglicana do Rio de Janeiro ou até mesmo da Ordem de São Tiago de Jerusalém, na qual partilhamos esperanças e temores.
Depois dos últimos acontecimentos na IEAB, resolvemos partilhar nossa reflexão sobre a eclesiologia em que se fundamenta a nossa Igreja, que – nos parece – vem sendo esquecida por setores do clero e do laicato.
Primeiramente, temos que esclarecer o que é Eclesiologia? (do grego ekklesia= Igreja; Logia= Discurso). É o ramo da Teologia Sistemática que trata da Igreja: seu papel na salvação, sua origem, sua doutrina, sua disciplina, sua forma de se relacionar com o mundo, sua presença social; e também as mudanças ocorridas, as crises enfrentadas, a relação com outras denominações e sua forma de governo.

19 de set. de 2012

Eu não sou “anglicano”!

Já fui! não sou mais! Prefiro ser o que era antes, desde que entrei na Igreja, que na época chamava-se Igreja Episcopal do Brasil (IEB), e alguns anos antes do meu ingresso ainda era Igreja Episcopal Brasileira. 

Sou Episcopaliano, ou como se dizia antigamente, sou Episcopal.  Estou com saudades da Igreja que eu conheci e que hoje parece estar moribunda!

Saudosismo decorrente da idade? Não! indignação por ver deteriorarem-se os valores que tocaram meu coração e me fizeram um apaixonado pela Igreja Episcopal, meu espaço de comunhão íntima com Deus, em comunidade!

(Aqui novamente peço a compreensão dos leitores não episcopalianos ou anglicanos por tratar de um assunto muito específico… mas talvez essa reflexão possa ajudá-los a refletir sobre suas próprias denominações)

O problema é que sob o substantivo (ou seria adjetivo?) “anglicano” se identificam muitas coisas, denominações e seitas, e adjetivos complementares sem qualquer nexo (anglo-qualquer-coisa)! Ou seja, não sei mais o que significa “anglicano” hoje! Antes era uma Comunhão! mas agora parece ser uma confusão!

Não nasci na Igreja Episcopal, mas a descobri por indicação de um Bispo Romano, amigo de minha família, aos 19 anos. Conheci a Igreja Episcopal e nela encontrei acolhida e espaço para desenvolver minha espiritualidade de recém convertido a Jesus Cristo, isso há 43 anos. Cresci muito na minha fé e espiritualidade graças à saudável combinação de Sacramento e Palavra, Liturgia e Escritura. Fui me tornando episcopaliano lentamente, de forma sadia, descobrindo as imensas riquezas da Igreja em sua diversidade. Não havia a frieza protestante da concentração racional na Palavra, nem o vazio de conteúdo dos ritos romanos cujos padres, à época, tratavam o povo como criança nos “sermões”.  Aprendi a conviver com os diferentes dentro do espírito de comunhão em Cristo e pertença a uma Comunidade cuja diversidade é sua identidade.

As diferenças não eram partidarismos, mas expressões de diferentes maneiras de viver a espiritualidade cristã, e isso não criava muros de separação nem de discriminação. Convivíamos todos em meio a um saudável clima de amizade solidária e bons debates teológicos sem que houvesse qualquer teor de personalismos e individualismos. Ninguém se autoproclamava dono da verdade, mas a Verdade se expressava em meio à diversidade de compreensões e experiências.

Era uma igreja ufanista, infantilmente ufanista! não era um ufanismo de poder, mas de imitação e auto identificação com a Igreja dos EUA; mas, ao mesmo tempo, havia o fato que, em nosso meio, todos eram bem acolhidos – antes mesmo de inventarem a tal inclusividade. Uma Igreja que crescia lentamente pela adesão de pessoas inteligentes que buscavam uma alternativa de vivência cristã engajada e espiritualidade solidária. Havia muitos problemas, falta de visão e planejamento e alguns personalismos, mas isso não nos afastava uns dos outros. Nós brincávamos com as nossas diferenças em clima de real amizade e verdadeira solidariedade. Nas reuniões litúrgicas ou de estudo das diferentes comunidades percebia-se claramente forte piedade e senso de compromisso.

Eu costumo dizer – e isso aprendi com meus mestres – que o nosso “ethos” não se aprende pela razão através de manuais ou confissões doutrinárias, mas através da vivência com a diversidade da Igreja, tendo o Quadrilátero de Lambeth-Chicago como pano de fundo. Apesar de toda pompa que havia em alguns cerimoniais das comunidades mais litúrgicas, havia uma simplicidade que se traduzia no acolhimento carinhoso de todos por todos. E apesar da simplicidade de comunidades mais próximas ao universo protestante, havia uma profunda piedade e reflexão a partir da Palavra de Deus e da Tradição Cristã com suas muitas vertentes. 

O clero não era arrogante, mas quase todos eram bons pastores, curas de almas como se dizia. Os Bispos eram homens simples, próximos, com senso paternal e ao mesmo tempo exerciam sua autoridade de forma segura e madura, embora em sua grande maioria tentassem centralizar a administração e não estavam preparados para isso; todavia, não estavam contaminados pelo espírito de príncipes ou da verticalidade hierárquica romanista. A Igreja se expressava através das dioceses, e o conceito de Província era muito mais um símbolo de unidade eclesial que burocracia estrutural eclesiástica e curial!

Como na maioria das Igrejas Históricas, a reflexão teológica existia e se expandia a partir do Seminário, ao qual fui admitido como estudante avulso (e pagava regularmente minha mensalidade sem descontos) quase ao mesmo tempo em que fui recebido na Igreja, porque eu pretendia estudar Teologia e buscar horizontes vocacionais – razão pela qual o Bispo amigo de minha família, um bom pastor, me sugeriu conhecer a Igreja Episcopal. O STIEB (Seminário Teológico da Igreja Episcopal do Brasil), na época sediado em São Paulo, era espaço ecumênico por excelência, tanto em nível docente quanto discente.

O lento aprendizado sobre o ser da Igreja Episcopal (“ethos”), a sabedoria pastoral do clero e dos Bispos com quem convivi, em verdadeiro espírito de companheirismo, fez minha vocação amadurecer por 14 longos anos de postulantado, mais um ano como Candidato às Sagradas Ordens. O fechamento do Seminário complicou minha formação teológica regular, mas graças ao carinho dos antigos professores e do Bispo Takatsu, fui estudando Teologia em diferentes instituições, e no então nascente IAET, sob a tutela do próprio Bispo, sempre às minhas próprias expensas (nunca fui bolsista da Igreja). Na mesma época eu estudava filosofia, economia e depois matemática;  trabalhava para me manter (fui analista de sistemas da primeira geração no Brasil); militava no movimento estudantil e no movimento ecumênico que era pouco institucional. Tempos da repressão e da ditadura militar, a Igreja (a bem da verdade, uma boa parte das Igrejas, não só a IEB) era espaço de resistência política, de reflexão ética e também de refúgio para os perseguidos.

Os tempos mudaram, a Igreja também…

Perdemos, cada vez mais, o senso salutar de diversidade em comunhão; aquilo que deveria ser simplesmente estilo e ênfase decorrentes de uma vivência pessoal ou comunitária ("churchmanship") vem se tornando movimento partidário provocador de desunião e antipatias, sendo profundamente segregacionista; já nos trouxe um cisma (Recife) e nos coloca sob risco de outros.  Tenho visto clérigos e seminaristas assumindo modismos e "tradições" sem realmente terem clareza do conteúdo - muita pompa e pouca igreja! Aproveitando uma ideia de Kierkegaard,
“A fé não é, pois, um impulso de ordem estética; é de outra ordem muito mais alta, exatamente porque pressupõe resignação. (...) Pois é necessário possuir força, energia e liberdade espiritual para efetuar o movimento de fé.” (in Temor e Tremor)
tenho para mim que preocupações exageradas quanto à forma indicam pouco ou nenhum conteúdo...

O problema da IEAB, e das Igrejas Históricas em geral, é que estão se tornando Igrejas Histéricas e Estéreis (e incluo também a Igreja de Roma) diante da onda neoliberal do individualismo e da prosperidade a qualquer preço. As Igrejas tentam compreender e enfrentar o mundanismo da pós-modernidade a partir de análises “científicas",  esquecendo-se que antes é preciso colocar-se de joelhos, e clamar pela Luz que vem do Alto...

Precisamos recuperar o senso de piedade salutar, ao invés de buscarmos modismos estéreis; deixar de catar a esmo riquezas do baú da Tradição Herdada sem refletir sobre as origens da Tradição; e parar de brincar com identidades que mal compreendemos ou são estranhas à nossa história e formação cultural como brasileiros e membros de uma Igreja que se enquadra historicamente no conceito de Protestantismo de Missão, embora tenhamos algo a ver também com o Protestantismo de Imigração, especialmente na região de São Paulo e Norte do Paraná (comunidades de origem japonesa).

Aposta-se hoje no crescimento da Igreja em termos da quantidade de gente atraída pelos artifícios do “marketing da bênção” e da venda de sacramentos para a vaidade da classe média decadente (“casar na Igreja do casamento do Príncipe!”), crescimento rápido sem conteúdo, clientela consumidora de rituais e de personalismos clericais ao invés de fiéis a Jesus Cristo. Há uma necessidade de expandir o mercado e atingir novas clientelas, bem de acordo com a proposta do neoliberalismo que assola o mundo. Tudo isso em busca de “recur$o$”  para garantir a sobrevivência de uma instituição que, nos últimos 35 anos, foi incompetente na gestão do enorme patrimônio legado pelas gerações passadas!

Eu entendo que a IEAB precisa se libertar de estruturas tacanhas que servem a interesses pessoais no "jogo de poder" insensato. É necessário fortalecer os ambientes diocesanos ao invés de, por exemplo, uma pretensa cúria nacional centralizadora e altamente estruturante que pretende vincular a si toda as articulações e ações da Igreja; o conceito de Igreja Nacional, na tradição que herdamos dos nossos fundadores diretos (missionários da hoje TEC – The Episcopal Church, E.U.A.), é mais voltado ao senso de unidade solidária que estruturas burocráticas. 

Note-se que a própria TEC está revendo suas opções estruturais retornando gradualmente ao conceito fundante do séc. XVIII: Igrejas Diocesanas com forte senso missionário, abrindo mão da enorme estrutura, caríssima, que por muitas décadas desenvolveu. Interessante ver esse senso de autocrítica na TEC, um exemplo para sua mais dileta filha na América do Sul... O excesso de burocracia estrutural, naquilo que deveria ser infra-estrutura, acaba gerando espaços ilusórios de centralização do poder em diferentes níveis e cultivam a cobiça...  (sobre isso veja meu relatório transformado em documento conciliar da Diocese Anglicana do Rio de Janeiro, datado de 2011 < clique aqui > 

Eu gostaria de propor que tivéssemos oportunidades de encontros do clero, em caráter sacramental, não para ouvirmos sumidades teológicas, sociológicas, técnicas ou de caráter social, mas como oportunidade de partilha em oração, intercessão mútua, troca de experiências pastorais e dividir a carga entre nós todos, não deixando apenas nas costas do episcopado, "suportando-nos (dando suporte) uns aos outros em amor..." (cf. Efésios 4.2).

Eu até estava me animando com a ideia de um futuro Encontro Nacional do Clero, mas isso acabou se tornando um evento formal, criado pela boa vontade de algumas pessoas, mas dentro da estrutura burocrática e hierárquica, com uma agenda elaborada a partir de velhos paradigmas. Eu esperava que houvesse um processo a partir dos grupos clericais locais e diocesanos, para exercitar a partilha e a convivência fraterna há muito perdida, até chegarmos ao momento da partilha ampla e nacional; um processo que estava surgindo de forma espontânea mas que foi atropelado pela burocracia institucional viciada em fazer as coisas estruturalmente, apesar da boa vontade e boa intenção das pessoas que tomaram à frente na organização do evento. Agora teremos mais um evento na agenda da estrutura nacional, profundamente artificial, do qual não me sinto animado em participar: já tem até uma agenda de atividades totalmente elaborada, tudo muito bem enquadrado… não questiono a boa intenção, mas a forma como a coisa foi encaminhada,

Parece que a Igreja, orgulhosamente auto identificada como “anglicana” e lamentando a existência de tantos outros “anglicanos”, acabou perdendo sua identidade mais original, de comunhão na diversidade, de autoridade dispersa e compartilhada, de vocação profética, de dons e ministérios geridos pelo Espírito Santo que – na minha maneira de percebê-Lo – é adverso a toda burocracia, pois sopra onde quer! (será que estou ficando pentecostal??? em tempos de neo-pentecostalismos histéricos, é até profético ser pentecostal!).

A Igreja está se perdendo na confusão dos partidarismos e da mesquinharia personalista de disputas internas: o poder não para o exercício da autoridade como serviço, mas como afirmação de poder pelo poder! E ninguém se dá conta que tal poder é tão ínfimo e sem consistência a não ser a ilusão da pompa e da circunstância!

Com tristeza leio Amós 4.4-13 e vejo ai um paralelismo com nossa história mais recente; temos deixado de lado a oração e a penitência, a busca de Deus e a santa obediência, seduzidos pelo demônio do sucesso a qualquer preço aliado ao desespero da auto $ustentação! Nessa busca desesperada, caçamos inspiração não em nossa própria Tradição, mas na cópia de receitas pouco salutares dentro do baixo evangelicalismo ou em imitações tacanhas de um romanismo velho e caduco, cheio de símbolos vazios, deslocados de nossa realidade e história, tudo para aumentar a clientela.

Mas eu confio no movimento do Espírito. Deus está se movendo e não nos deixará naufragar no mar de nossas própria confusões. Portanto, preparemo-nos todos para encontrarmo-nos com nosso Deus e Senhor (cf. Amós 4.12), mas confiemos também em Sua misericórdia e promessa quando afirmou que estará conosco para sempre (Mateus 28.20).

O Espírito Santo nos impele novamente a buscar as Escrituras e a estudar a Tradição Herdada, não como estética, mas como conteúdo reflexivo da caminhada de 20 séculos feita pela Igreja de Cristo entre acertos e erros, sempre sob a proteção de Deus e rendida (nem sempre) à Direção do Espírito Santo que nos foi enviado pelo Pai e pelo Filho!

Quanto a mim, não sou “anglo-isso” ou “anglo-aquilo” ou ainda “anglo-aquilo-outro”. Estou voltando a ser, cada vez mais, um Episcopaliano sem adjetivos complementares, como eu me tornei desde quando optei pela Igreja Episcopal e nela fui acolhido com carinho pastoral e solidariedade. 
Amém!
===/===

26 de ago. de 2012

VOTO DE CABRESTO OU RESPONSABILIDADE PASTORAL?

FALE

Fico feliz em ver o FALE assumindo essa campanha! O FALE foi uma iniciativa que começou quando eu era o Secretário Regional do CLAI para o Brasil, e foi exatamente o apoio institucional do CLAI que permitiu o surgimento do FALE. Por muitos anos fiz parte da equipe de assessores e redatores do FALE. Uma das mais belas iniciativas realmente evangélicas, inspirado no movimento SPEAK-UP da Inglaterra, o FALE do Brasil se tornou o maior grupo da Rede no mundo.

O posicionamento do FALE vai exatamente contra aquele tipo de clérigo que “vende” seu voto e o voto de sua congregação, em troca de favores políticos, escusos.

Isso não significa afirmar que clérigos devam esconder suas posições políticas! Exatamente por sermos um Estado Laico, os clérigos são primeiro Cidadãos (porque não nascem clérigos) e devem exercer sua cidadania com transparência e devem SIM, por serem formadores de opinião, ajudar o povo de suas comunidades a exercer sua cidadania, como princípio ético. Não se trata de "obrigar" o voto, mas levar à uma análise crítica da realidade à luz da Palavra de Deus, o que seria de fato seu papel como teólogo com a comunidade. O que não se deve fazer, por ser antiético, é atrelar seu ministério a um projeto eleitoral que implique em "benefícios para a igreja".

Calar-se diante de uma realidade por ser clérigo, seria na verdade apoiar uma situação existente e um núcleo de poder político. Nesse caso Dietrich Bonhoeffer, por exemplo, não poderia ser considerado uma referência ética cristã contemporânea. Seu posicionamento político foi bem claro e o levou a atitudes radicais diante de um poder diabólico que - exatamente em nome da neutralidade religiosa, foi apoiado pela Igreja oficial.

Nada deve parecer natural
Se o pastor omitir-se, a mídia vinculada ao poder dominante atrela o povo... Os opressores poderosos não são invencíveis!


Meus paroquianos sabem com clareza minha posição política, ela está expressa de forma transparente até mesmo no FACEBOOK, e nem por isso sentem-se no cabresto do seu pastor. Aliás, aqui no Rio, eu voto FREIXO.

===/===

30 de jul. de 2012

A Coisa

O despertador tocou às 6h00, como todos os dias; João levantou-se abriu a veneziana e contemplou a rua, aspirando o ar fresco. Estranhou o pouco movimento, mas deu-se conta que era sábado; já os bem-te-vis e os pardais faziam a costumeira arruaça matinal. “Eles não têm sábado, nem domingo, eles não estão presos às convenções do tempo”, e esse pensamento fez surgir um sorriso no rosto de João. Tomou banho, lavou a dentadura, fez gargarejo com o Listerine, vestiu-se, desceu até a cozinha, bebeu os dois copos de água que o médico recomendou, e saiu para comprar o pão na padaria da praça, ali perto, e pegar o jornal na banca do Reinaldo, para depois fazer o café e ver o que o editor do jornal queria que ele ficasse sabendo. Tudo como sempre fazia desde que se aposentou.


Ao sair para o pequeno jardim do sobrado, ele a viu! Estava ali, no lado esquerdo do canteiro de copos-de-leite. “Estranho”, pensou João, “que é essa Coisa ai?” La estava aquela Coisa, e João tinha certeza que ontem não estava lá.  Mas agora estava lá, solene, na terra, entre os copos-de-leite, imperiosamente ela mesma, aquela Coisa. João se aproximou para ver a Coisa mais de perto: “Que Coisa é essa?”, e ficou olhando interessado.

Nisso, passou o Garrido, com seu sorriso bonachão dando o solene “Buenos Dias” com seu sotaque portenho, e então percebeu o João entretido com a Coisa. “Que Cosa es esta?” perguntou. “Não sei, essa Coisa apareceu aqui assim, sei lá vinda de onde!”  Garrido entrou no jardim e pôs-se também a olhar a Coisa. E estavam os dois olhando a Coisa quando passou dona Severina, nordestina arretada, neta de cangaceiro  e evangélica, que ao ver a Coisa logo foi dizendo: “Essa Coisa ai não é coisa de Deus!"” e entrou para olhar a Coisa também ao mesmo tempo que repreendia a Coisa.

Logo várias pessoas da vizinhança estavam ali, olhando a Coisa, pois todos que passavam se interessavam e vinham perguntar que Coisa era aquela. E todos diziam alguma coisa sobre a Coisa. Várias hipóteses surgiram para explicar a Coisa, mas ninguém conseguia dizer que coisa a Coisa era.

Vicente, o filósofo da rua, disse que já tinha visto muita coisa, mas nunca tinha visto uma coisa como aquela Coisa. Gilberto, que estudou dois anos de engenharia na juventude, disse que talvez a Coisa tivesse relação com um tal de Bóson de Higgs (“é com agá, mas a gente fala como se fosse erre”, salientou) que alguém tinha visto na Suíça, mas foi contestado pelo Vicente dizendo que o Bóson de Higgs era outra coisa e não aquela Coisa.  “Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa e nada é a mesma coisa. Isso está me parecendo uma coisa estranha”, concluiu Vicente.

Dona Severina, continuava dizendo que a Coisa não era coisa de Deus, e já estava reunindo um grupo para orar pedindo a Deus que mandasse um profeta explicar o que era aquela Coisa, enquanto Gilberto, expressando seu ateísmo materialista, reclamava que a dona Severina não dizia coisa com coisa, e que aquela Coisa não tinha nada a ver com religião, uma coisa que ele não gosta.

Verinha, balzaquiana solteira, defensora dos direitos humanos, da ecologia e representante da rua na Associação do Bairro, chegou dizendo que a Coisa tinha o direito de estar lá e que ela não admitiria que alguém tentasse pegar na Coisa, e aproveitou para distribuir os panfletos sobre a próxima assembleia do bairro, que deveria tratar de várias coisas.

O fato é que todos falavam alguma coisa sobre a Coisa, e muita coisa se dizia sobre a Coisa, mas ninguém dizia realmente qualquer coisa que explicasse a Coisa. Alguém sugeriu chamar a Polícia ou os Bombeiros, mas outrem disse que isso não é coisa de Polícia, e que talvez fosse melhor deixar a Coisa como estava porque as coisas vão e vem, a vida é uma coisa assim mesmo. Verinha retrocou dizendo que não podiam ser conformistas e deviam lutar pela Coisa, porque era a coisa mais certa a fazer. “A Coisa é nossa, está na nossa rua e nós temos de cuidar da Coisa contra a manipulação política da Coisa! e só de pensar na Coisa, me dá aquela coisa, sabe, de me arrepiar toda!”

Foi então que chegou o Toninho, moleque da rua que fazia pequenos serviços para a vizinhança em troca de umas moedas para seu cofrinho de lata. Sem dar importância ao grupo que estava discutindo a Coisa, foi logo dizendo:
_“Ô seu João, ontem quando vim limpar seu jardim esqueci uma coisa… ah! está aqui!”, e pegou a Coisa.  Todo mundo ficou admirado!

Toninho já ia saindo quando o Vicente resolveu fazer a pergunta que todos queriam:
“Ô garoto! Essa Coisa é sua? que Coisa é essa?”
“Ora, é uma Coisa minha! só isso!”, e Toninho saiu correndo feliz por ter achado sua Coisa.

Pouco depois todos se deram conta que a Coisa não estava mais lá; afinal era Coisa do Toninho e ninguém tinha nada a ver com a coisa. Então, cada um foi cuidar das suas próprias coisas.

“Que Coisa!”, exclamou João, e foi direto à padaria.
===/===

21 de jul. de 2012

Do Poder, do Episcopado e outros babados.

s_pedroepaulo Instituições tem a cara dos seus dirigentes. O caráter humano é essencial na identidade de cada instituição. O caráter humano é muito influenciado pelo poder, essa “coisa mágica” que permite algumas pessoas exercerem autoridade sobre as outras dentro de um espaço institucional, seja a família, seja o Estado, seja uma ONG, seja uma comunidade de fé ou uma denominação religiosa.

Quando se trata de uma instituição religiosa, a coisa se complica um pouco mais, porque há tendência das pessoas sacralizarem a instituição, ou seja, pensar a instituição como algo divino, de tal forma que seus dirigentes são entendidos como “escolhidos pela Divindade”, e portanto sua autoridade e seu poder emana do próprio Divino.
[ Uma piadinha teológica: quem quer que já tenha participado de um processo eleitoral para a escolha de dirigentes eclesiásticos, de qualquer denominação cristã, sabe os conchavos e acordos que são feitos entre os diferentes grupos de interesses que naturalmente existem em qualquer agrupamento humano. Como cada grupo se entende iluminado pela Divindade, podemos imaginar a Divindade em contradição consigo mesma! ou então, morrendo de rir com a petulância de cada grupo! ]
Houve tempos e sociedades (e ainda hoje há algumas sociedades assim) em que o Estado se confunde com o Divino; chamamos isso de Teocracia. Há centenas de exemplos históricos demonstrando que as teocracias foram um fracasso e não acabaram bem… e as populações à elas submetidas sempre viveram mal. No mundo ocidental, após a queda do Império Romano do Ocidente, o poder ficou pendente entre a nobreza que sobrou do Império, os chefes das clãs “bárbaras” e a Igreja Cristã.

Já naquele tempo, enquanto a Igreja do Oriente era etnicamente e culturalmente dividida, a Igreja do Ocidente se identificou como Instituição sólida e “católica”, ou seja, a mesma “única igreja” e idêntica em todo o “mundo”, assumindo o poder unificador antes exercido pelo Império Romano; aliás, até a cúpula da Igreja ficou localizada na antiga Cidade Imperial. Assim, as negociações pelo controle do poder acabaram gerando uma relação de mútua dependência entre o que hoje entendemos como Estado (forçando a barra, porque pensar em Estado na época medieval é um tanto quanto absurdo) e o poder “sagrado” da Igreja. Bispos coroavam Reis e as complexas relações de senhorio e vassalagem criavam um certo equilíbrio, não muito sólido, mas administrável. Com o advento da Modernidade, o poder do Estado foi se tornando independente do poder sobre o Sagrado, embora as relações entre ambos sempre fossem cordiais (com raras e históricas exceções) promovendo fluxo de privilégios de um para o outro em mão dupla.

A Reforma do século XVI e as posteriores reformas acontecidas a partir dai na Igreja do Ocidente, não mudaram esse quadro. Porque tal quadro é inerente às instituições… a disputa de poder interno é parte da natureza das instituições – qualquer instituição, porque são constituídas por pessoas e todas as pessoas estão sob a dinâmica de Gênesis 3: a tentação de ser igual a Deus e perder o Paraíso...
Como instituição em si mesma, a Igreja não tem sentido algum, nem tem finalidade alguma na realidade humana. Viveríamos muito bem sem a Igreja enquanto pensada como instituição. Até porque muita gente vive bem e feliz sem estar ligada à qualquer coisa que seja religião institucional. Mas há uma natureza transcendente na Igreja que vai além de sua institucionalidade: é sua compreensão enquanto parte do Povo de Deus (o Qual tem muitos nomes e muitos povos).

A reflexão que se segue é focada exclusivamente na Igreja onde estou. Perdoem-me os leitores de outras denominações e confissões, mas talvez tal reflexão possa ajudar, com as devidas adequações, uma reflexão em outros contextos.

A Igreja onde vivencio comunitariamente a minha fé e exerço meu ministério é uma Igreja Episcopal (até no nome!). Isso significa que a Autoridade na Igreja é exercida pelo Episcopado, porém, entre nós, o Episcopado não é um absoluto em si mesmo (embora hajam bispos, clérigos e leigos pensando que seja!). Bispos são eleitos pela Igreja, clero e povo (já fica claro que o clero não é povo! mas chamado e separado para ser servo do povo!), não são nomeados por uma autoridade central (no caso da Igreja da Inglaterra, é um pouco diferente, mas isso é lá um problema deles, eu não tenho nada com isso e nem me afeta diretamente) e seu poder é exercido dentro do conceito de Autoridade Dispersa e Compartilhada, que é um dos nossos princípios basilares de identidade e nos caracteriza como uma Igreja de Tradição Católica e Reformada . Qualquer presbítero ou presbítera poderá ser levado ao Episcopado  pelo voto da Igreja conforme normatizado pelos Cânones Gerais [ inclusive eu, embora haja gente que treme na base ao imaginar isso! (risos irônicos) ].

Atribui-se ao Apóstolo Paulo a afirmação que “quem aspira ao Episcopado, boa coisa aspira” (1ª Timóteo 3.1), embora na Almeida Revista e Atualizada conste “Fiel é a palavra: se alguém aspira ao episcopado, excelente obra almeja”  e na Nova Versão Internacional o texto diz “Esta afirmação é digna de confiança: se alguém deseja ser bispo, deseja uma nobre função”. Importante notar que a Palavra se refere à obra ou à função! O Apóstolo vincula o conceito de episcopado ao conceito de serviço (Diaconia!).

Eu sempre digo aos seminaristas pretendentes ao Ministério Ordenado, especialmente ao Presbiterado, que é dever nosso como presbíteros ter muita clareza sobre o fato do Episcopado ser um horizonte possível no ministério de cada um. Cada um de nós deve ter uma posição bem clara sobre a possibilidade de ser chamado ao Episcopado: em primeiro lugar, se aceitaria isso para sua vida; em segundo lugar, em que circunstâncias de sua vida aceitaria isso (em que momento de sua vida), em terceiro lugar, quais os critérios próprios para aceitar a indicação.

Caso contrário, o Episcopado pode surgir como uma “evolução natural da carreira eclesiástica”, como é o generalato para a carreira militar. Acontece que o Episcopado não é isso, Bispos não são Generais mas são Pais ou Mães em Deus (ou deveriam ser e comportar-se como), nem recebem o Episcopado pelo mérito de uma carreira bem sucedida e pelos “bons serviços prestados à Igreja” (quando alguém é eleito Bispo nessas condições, quase sempre dá em merda!): Episcopado não é coroamento de carreira, porque o Ministério Ordenado não é uma carreira profissional, pelo menos eu o entendo assim. Evidentemente que, ao olharmos a Igreja em seu aspecto institucional, há uma carreira eclesiástica, mas há o caráter transcendental que define o Ministério como chamado e  envio para o Serviço em nome do Senhor Jesus Cristo, em fiel obediência a Deus e aberto à ação do Espírito Santo.

De fato, eu comecei a pensar nisso ainda no tempo de seminarista, até mesmo porque alguns dos meus professores estimulavam que todos nós fizéssemos essa reflexão. Assim, desde muito cedo eu tenho bem claro o horizonte do Episcopado e tenho bem definidas as respostas às questões enunciadas acima.
Além disso, entendo o Episcopado como um serviço e portanto não tenho um projeto pessoal de Episcopado, porque o projeto que interessa é o projeto da Igreja, da Diocese. O erro da Igreja Episcopal no Brasil (e em outras partes do mundo) é que se elege um Bispo e não um Projeto para o qual se busca o líder adequado para sua execução por toda a Igreja Diocesana. Ou seja, elege-se o Bispo e dane-se ele! Tudo passa a depender dele e - ou se concorda e apoia ou se discorda e faz-se oposição velada. 

 Eu entendo que o Episcopado deve ser exercido de forma a contemplar um plano diocesano de ação e não um projeto pessoal.  Assim, a minha grande condição para aceitar concorrer ao Episcopado seria que me fosse oferecido e mostrado um Plano Diocesano, que não são metas simplesmente, mas um Projeto que tenha claro de onde se parte e de onde se quer chegar, e as alternativas de caminho, e eu de fato avaliaria se me sinto capaz – e se sou a pessoa adequada – para exercer tal responsabilidade de liderança. Como a Igreja é recheada pela cultura política brasileira, não há projeto, mas apenas o desejo de ter alguém que carregue o piano e favoreça uns e outros…  Não é o Bispo que deve ter um projeto, mas a Igreja Diocesana. E, de preferencia, que seja construído antes do Bispo… e que depois da escolha do Bispo o projeto seja executado pelo conjunto da Igreja e aferido, avaliado e reformulado sempre com a participação de toda a Igreja.

Acho que o Bispo não deve ser o gerente da Igreja; deveria deixar isso para especialistas que estão na Igreja; o Bispo deve ser Pai (Mãe) e Pastor do Clero e com o Clero, Pai (Mãe) e Pastor do Povo. Todo clero é incardinado em seu Bispo (termo técnico que designa a vinculação ao Bispo) e por isso, o Bispo deve estar incardinado em seu Clero e Povo (estar no coração). Mas é preciso que a Igreja amadureça muito ainda para entender e viver isso realmente, e – pela minha idade – não verei isso acontecer…

Nos próximos doze meses a Igreja deverá eleger pelo menos três novos Bispos. Não sou candidato em nenhuma dessas eleições: em duas nem fui convidado a sê-lo (rsrsr), e para todos que me sondaram para a terceira, fiz a mesma pergunta: qual é o projeto diocesano? até agora ninguém me deu resposta adequada e por isso, agradeço a lembrança do meu nome mas… não me sinto capaz de carregar e tocar sozinho pianos desafinados – se houver uma orquestra, até posso ajudar com o piano, ou um violino, mas uma orquestra só toca bem com bons músicos e uma boa harmonia, e isso não depende só do regente, mas de cada um com seu instrumento.

Que Deus abençoe a IEAB, e que o Espírito Santo oriente – com paciência! – os processos de eleição episcopal em curso.
===/===

5 de jun. de 2012

Por que clamar em favor da Igreja?

CLAMORDesde o Domingo da Trindade, a Paróquia São Paulo Apóstolo começou uma campanha interna de clamor em favor da Igreja de Cristo: por toda a Igreja e particularmente pela Igreja Episcopal Anglicana do Brasil e a Comunhão Anglicana.  Por que a comunidade decidiu isso? Uma reflexão no Pentecostes sobre o estado da Igreja no mundo e, particularmente no Brasil, levou-nos reconhecer a necessidade de – mais que uma intercessão – iniciarmos um clamor.
CLAMAR é o ato de manifestar diante de Deus a nossa indignação e a nosso completo desacordo com a realidade que vemos! e é manifestação de compromisso em OUVIR o SENHOR e OBEDECER À SUA VONTADE! Para compreender o conceito de clamor, sugiro meu artigo no blogue da Paróquia São Paulo Apóstolo, “Clamor!”.