No final dos anos 50 e início dos 60 do século passado, a TV brasileira engatinhava. Não havia videoteipe, tudo era feito “ao vivo e em preto&branco” e a improvisação era a grande arte! Não havia a baixaria dos programas religiosos, claro.
Lembro que as propagandas eram feitas em estúdio, com uma moça, chamada garota propaganda, apresentando os produtos. Essas moças pagavam muito mico: ela mostrava o novíssimo liquidificador Arno e picava banana, maçã, colocava leite, mostrava como era “fácil fazer uma deliciosa vitamina de frutas”; então girava o botão para ligar o incrível equipamento e nada acontecia! Ela dava um sorriso, girava o botão de novo. Sempre sorrindo, ela tenta novamente, nada! então aparece um sujeito por trás da cena e liga alguma coisa na tomada, era o liquidificador que não estava “plugado”. E então o aparelho começava a funcionar e a tampa saia fora e a pobre “garota propaganda” tomava um banho de vitamina! A imagem saia do ar, entrava o indiozinho da Tupi. Eu me dobrava de rir! Outra vez, a moça estava mostrando um incrível sofá-cama, grande novidade. Ela vai mostrar como é fácil armar a cama, ergue o assento do sofá, o dito cujo escorrega para trás, derruba a parede do cenário, uma confusão danada, novamente a imagem sai do ar e aparece o indiozinho…
A garotada se amarrava nas Aventuras do Capitão 7, que passava na TV Record de São Paulo, o Canal 7 , onde também havia um programa que a gente curtia muito às 6 horas da tarde: Pullman Junior e depois a Turma dos 7. O Capitão 7 era o nosso super-herói, e fazia sucesso ao lado do Vigilante Rodoviário. Legal mesmo era o Pullman Junior: crianças se inscreviam para participar, e ficavam lá comendo bolo Pullman, tomando Guaraná Antártica e vendo desenho animado. Uma vez eu participei junto com meu irmão Ricardo. Mamãe ficou dias tentando pelo telefone a nossa inscrição (telefone naquela época era mais complicado que celular da TIM). Conseguiu, era um programa especial de carnaval e fomos fantasiados de palhaço, eu e o Ricardo (nós havíamos ganho um prémio de originalidade no baile infantil naqueles dias, e mamãe estava orgulhosa das fantasias que ela mesma havia confeccionado!).
Chegamos na TV Record, que ficava pertinho do longínquo Aeroporto de Congonhas, e era simplesmente um conjunto de barracões cheios de divisões internas (os funcionários chamavam de estúdios!). Logo na entrada, um saguão, estavam três senhoras sentadas conversando. Reconheci uma delas rapidamente, era a esposa do Palhaço Pimentinha, que era companheiro do Arrelia, no Circo do Arrelia. Essa senhora era uma espécie de faz tudo: atuava no circo, fazia às vezes de garota propaganda, fazia número em programas que tinham de apresentar pequenos auditórios, etc. Ela olhou para mim e disse: “Olha só, se ele fosse magrinho, seria igual ao Pimentinha!” e todo mundo caiu na gargalhada, eu fiquei vermelho de vergonha! Fomos para o estúdio do Pullman Junior e foi quando descobri que era apenas um canto, onde haviam algumas mesas, um monte de criança sentada nas mesas comendo bolo; a gente mal podia ver o desenho animado, porque a televisão ficava por trás. Havia uma menina que apresentava o programa naquele tempo, acho que era a Débora Duarte!!! ela veio me entrevistar e eu fiquei todo orgulhoso: eu estava falando com a Débora, a menina que perturbava meus colegas de ginásio!!! eu tinha 11 anos!
Foi ai que alguém da TV Record me achou! Havia um programa muito legal, chamado Turma dos Sete, as aventuras de sete crianças, amigos e vizinhos. Um desse personagens se chamava Bolão e era gordinho. O menino que fazia papel de Bolão estava já muito “velho” para o elenco e estavam procurando outros. O sujeito que se apresentou como Produtor da Record gostou de mim… minha mãe, claro, ficou toda cheia de si, e lá foi o Luiz Caetano fazer semanas de testes, decorar texto, até que finalmente eu fui ao ar!!! Putz! Minha mãe passou dias no telefone avisando todos os parentes, inclusive os primos de segundo, terceiro e quarto grau, as vizinhas das cunhadas das primas, etc. que o Luiz Caetano ia estrear na TV no dia tal, ia ser o Bolão da Turma dos Sete, e claro, “ele tem talento, eu sempre soube disso, está muito bem e o diretor gosta muito dele!”. Pobre mamãe! como toda senhora jovem pequeno-burguesa vivia das fantasias do mercado…
Dona Renata, mamãe, deve ter elevado muito o Ibope da Turma do Sete naquele dia, se isso já existisse. Naquele tempo não tinha FACEBOOK, nem Twitter, então não tinha como “compartilhar”, o negócio era telefonar pra todo mundo mesmo. Não tinha videoteipe. A gente entrava no ar e a coisa tinha de rolar na marra! se saísse errado, a gente tinha de improvisar… era divertido!
Durou pouco meu tempo de TV. Meu pai cismou, no que foi plenamente apoiado pelo Diretor do Colégio Nossa Senhora da Glória, o Irmão Expedito Leão (Marista), que aquele negócio de trabalhar na TV e estudar não dava certo. E com seu jeito de pai mansinho, ele convenceu minha mãe e eu simplesmente tive de deixar o programa. Acho que fiz uns três programas, estava em fase de teste ainda.
Por isso é que o Lima Duarte, o Francisco Cuoco e o Tarcísio Meira fizeram sucesso! Meu pai bloqueou minha carreira na TV!!! mas tive meus dias de glória na telinha! e nem precisei escrever livro, virar presidente de qualquer coisa, nem pagar para aparecer no Jô para isso! E ainda ganhei uma graninha, que meu pai usou para comprar minha bicicleta Caloi aro 24, com a qual eu finalmente ganhei do Marcelo (que tinha uma Monark aro 24) nas corridas de bicicleta que a criançada da vizinhança fazia na Jackson de Figueiredo, bairro da Aclimação, São Paulo.
Se naquela época tivesse o FACEBOOK eu teria compartilhado com amigos, grupos, páginas, etc. É o modesto charme da burguesia! e vamo que vamo!
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A TV brasileira e os telespectadores perderam um grande talento. É por isso que falta algo mais interessante no Video Show ou não temos um programa de entrevistas com um entrevistador mais inteligente nos fins de noite.
ResponderExcluirValeu Marcelo! aliás, vc é candidato a alguma coisa? conte com meu voto! rsrsrsrsrs!
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