28 de dez. de 2011

Recordações Natalinas…

Esta época do ano acaba evocando recordações, especialmente as recordações da infância, que sempre brotam já relidas e adaptadas pelo nosso inconsciente, mas são as lembranças que temos…
Claro que logo recordo dos natais da minha infância, na casa de algum tio ou mesmo em minha casa, com a reunião da família ampliada (especialmente a família da minha mãe, porque a do papai estava no Rio e nós morávamos em São Paulo). 
Como bons italianos, ou filhos de, meus tios e tias tinham de discutir sobre tudo, e assim a famosa reunião de organização da festa natalina era um show de discussões sem sentido: quem vai dar (pagar) o peru? e o tender? (não pode faltar!). Tia Beatriz, sempre nervosinha, mas com uma calma impressionante nessas horas, resolvia logo sua parte: ela traria o pudim de caramelo, sua única especialidade.. Minha mãe era a responsável pela lasanha, com molho a chocolat, sua especialidade. Tia Lídia, claro, o pernil e os doces, mas mamãe também era encarregada das rabanadas!!! Os três tios mais ricos (os três médicos!!!) bancavam as coisas mais caras, e faziam questão, porque com certeza fazia bem para o ego deles. Uma vez, meu pai (que teve um momento de ganhar muita grana mas perdeu muito também) resolveu fazer a festa na nossa casa e bancou tudo ou quase tudo. O tio que fazia questão de mandar o peru, mandou e assim aconteceu de termos dois perus na mesa!!! (e isso rolou muita encrenca antes e depois do Natal, coisas de italianos… embora meu pai não fosse italiano, tinha sangue português e por isso, era birrento quando queria – quase nunca queria, graças a Deus).
E tinha o lance do Papai Noel. Era um funcionário do tio Mário, mas uma vez o cara não apareceu e eu, o primo gordo, tive de fazer a coisa… foi um saco aguentar os priminhos novos, filhos das primas mais velhas… mas acho que consegui dar conta.
Fantásticas mesmo eram as festas de Natal na casa do tio Acchiles, acho que o mais rico de todos até ser superado pelo seu irmão caçula… às vezes alternava com o tio Mário, um sujeito muito divertido e boa praça! Tinha direito a som de helicóptero antecipando a chegada do Papai Noel  (não sei se era um truque ou o velho Acchiles alugava mesmo um helicóptero para fazer a cena…).
Haviam alguns personagens que eram sensacionais. Personagens não, gente real, mas que pareciam não existir. Lembro de alguns.
O Francesco, companheiro da tia Beatriz, um metalúrgico (politizado pacas, e de esquerda, descobri isso depois) que me divertia muito com suas brincadeiras de mágico; ele fazia isso meio discretamente, porque era tímido, sempre ficava meio de lado (depois entendi que sendo de esquerda, não se sentia bem no meio daquele ambiente burguês de classe média ajeitada).
Um casal que eu gostava muito: o “Seo” José e sua esposa, a dona Êudice (o nome é esse mesmo, pelo menos assim o pessoal falava). Ela sempre muito elegante e conversadeira; o José, um sujeito bonachão, sempre sorridente e bom garfo; meu pai gostava dele. Eram sogros de uma das primas mais velhas. Mas o casal era uma figura e eu me divertia muito olhando eles de longe, os trejeitos da dona Êudice e o sorriso conformado do José.
E o tio Ricardo, o tio legal, o pobre da família, mas sempre de bom humor e cheio de piadas. Tinha mania de ser ufólogo e sempre contava suas incríveis observações de disco voador sobre São Paulo. Um sujeito sensacional, me ensinou a jogar xadrez e tinha inclusive o título de Mestre…
A tia Bicce (Beatriz) era um caso a parte. Tinha manias muito engraçadas e sempre queria agradar todo mundo… adorava uma boa fofoca (e com mamãe e tia Lídia, as três sempre tinham assunto pra semana seguinte – aliás, sempre tinham assunto!).
Não podia faltar o famoso retrato do vovô Caetano e da vovó Concetta, em um quadro enorme, enfeitado, no salão principal da festa. Quem trazia o quadro era o tio Acchiles, onde quer que fosse a festa. Quando dava meia noite, exatamente antes de começar a ceia, o pessoal todo se reunia sob o retrato dos avós e entre choros (italiano que não chora nessas horas está morto) e rezas, estouravam o champanhe e começava a comilança, logo depois de todo mundo se abraçar e dizer “Feliz Natal” uns aos outros.
Pelos 19 anos, eu aparecia na festa já na madrugada; naquele tempo eu ia na missa da meia-noite; havia tido minha experiência pessoal com Jesus e, assim, o Natal passou a ser, para mim, um momento essencialmente litúrgico.
Um dia dois tios brigaram e a coisa foi feia; naquele ano um deles não veio para o Natal, e a partir dai quando um vinha, o outro não vinha. Não sei bem até hoje porque brigaram, mas ouvi uma fofoca que foi por causa de umas pílulas…
Anos depois, o tio Mário faleceu exatamente na véspera do Natal, cuja festa seria na casa dele! Foi uma coisa terrível… a ceia pronta e o velório acontecendo…
A partir de então, acabou o natal dos Grecos. Cada núcleo familiar começou a fazer seu próprio programa…
O mundo ainda andava devagar, e as pessoas curtiam mais o Natal sem o excessivo consumismo… as famílias se reuniam mais e, apesar das encrencas, todo mundo se emocionava muito…
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