17 de jan. de 2010

A Lógica do Aquário

Um ibérico é proprietário da cantina em um campus universitário, convivendo assim com estudantes e docentes. Todos os dias, escuta as conversas sobre temas elevados da maior relevância acadêmica. Não compreende nada, mas gosta de ficar ouvindo.

Um docente, fiel cliente da cantina, costuma dar certa atenção ao Sr. Manoel, o qual, por isso, se sente mais íntimo do referido docente. Assim, numa tarde chuvosa de quarta-feira, estando lá o docente, Manoel lhe pergunta:

"_ Ó senhor professor doutor. Cá escuto sempre os senhores e os estudantes a falar de uma tal de Lógica. Em todas as conversas sempre aparece a tal da Lógica. Mas eu não percebo bem o que vem a ser isto. Poderia lá o senhor explicar-me?"

O docente, terminando de engolir a coxinha morna, disse - com seu ar pernóstico, acadêmico:

"_ Senhor Manoel, não é muito fácil explicar o que é Lógica para um leigo no assunto, como o senhor. Então vou dar um exemplo, e o senhor poderá entender."
"_Ora pois, agradeço muito seu interesse em ensinar-me".
"_ Vou fazer algumas perguntinhas para o senhor", continuou o docente, " e conforme as respostas vou concluindo coisas novas e assim o senhor vai entender o que é Lógica".

Passado um curto instante, o docente pensativo, disse:
"_ Senhor Manoel, o senhor tem aquário em sua casa?"
"_ Pois que tenho, com uns peixinhos coloridos muito simpáticos".
"_ Ló-go, o senhor tem filhos ainda crianças."
"_ Sim, pois que tenho lá os miúdos, que aliás gostam muito dos peixinhos".
"_ Então", prosseguiu o docente, "lo-gi-ca-men-te o senhor é casado!"
"_ Pois, sou casado com a Maria Hermínia, já há 15 anos".
"_ Lo-go o senhor dá suas trepadinhas".
"_ Claro que sim senhor! mas veja lá, só com a Maria! embora teve aquela mulata que faz as coxinhas, mas isso foi só umas poucas vezes, como um bacalhau cozido, sem importância alguma."
"_ Então, lo-gi-ca-men-te, o senhor não é viado!"
"_ Mas claro que não, ó pá! Sou é muito macho, um macho lusitano!"

O docente fez aquela cara de professor satisfeito, por ter ensinado migalhas de seu douto conhecimento,  e disse:

"_ Então, senhor Manoel, percebeu? Conforme cada resposta, eu ló-gi-ca-men-te fui deduzindo coisas a seu respeito. É assim que a lógica funciona."
"_ Pois! estou a perceber! uma coisa lo-gi-ca-men-te leva à outra. Muito obrigado, senhor professor doutor!"

No fim de semana, Manoel convida seu cunhado Joaquim Pedro para a bacalhoada e pelas tantas, assumindo o ar doutoral de quem sabe mais que o outro, diz:
"_ Ó Joaquim! tu entendes lá o que é Lógica?"
"_ Ora, carago, não faço a menor idéia do que seja isto!"
"_ Pois eu bem entendo disso, uma vez que trabalho na universidade e convivo com todos aqueles professores doutores. Vou explicar-te."
"_ Poorrrrra, Manoel, tú és mesmo um gajo instruído, Diga-me lá o que é a tal da Lógica!"

Manoel. tentando assumir um ar doutoral, diz:
"_ Pois vou fazer-te algumas perguntinhas e vais perceber o que vem a ser a tal da Lógica".

Manoel pigarreou, enquanto Joaquim tentava concentrar-se.
"_ Diga-me lá, ó Joaquim, tu tens aquário em casa?"
"_ Carago, Manoel,  não tenho!"

Manoel parou, pensou um pouco e respondeu:
"_ Então, Joaquim, lo-gi-ca-men-te, és viado! Entendeste?"
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[o melhor da piada é que a conclusão do Manoel está   ló-gi-ca-men-te   correta, de acordo com o modelo apresentado pelo docente: em uma sequência de proposições que se apresentam dependentes, a negação de uma delas, nega o resto da sequência.   A piada real é que o "professor doutor" deu um péssimo exemplo, um exemplo burro, e preconceituoso!]

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7 de jan. de 2010

Epifania

" Eis que vieram uns magos do oriente a Jerusalém, e perguntavam: ' Onde está o recém-nascido Rei dos judeus? porque vimos a sua estrela no Oriente e viemos para adorá-lo.(Mateus 2.1b-2)
Passou o Natal, passou o Ano Novo, terminou o apelo comercial dos presentes, das festas, dos cartões de felicitações... a vida retornou à sua normalidade cotidiana. Ou quase! Alguns ainda estão na exceção das férias de verão.

Mas é nesse tempo de normalidade cotidiana que o calendário cristão ocidental celebra a Festa da Epifania do Senhor. Os cristãos orientais, por sua vez, estão agora celebrando o Natal, pois para eles as duas festas coincidem. Outro lado do mundo... outra hermenêutica... outra teologia...

Mas nós estamos no Ocidente, com o nosso cristianismo greco-romano marcado fortemente pela Europa Medieval, refrescado pela Reforma no século XVI e renovado de tempos em tempos pelos diversos movimentos que eclodem no seio das comunidades herdeiras da Reforma. Para nós, cristãos herdeiros dessa Tradição, a festa da Epifania passa despercebida, sem muita importância. Não está na mídia, e geralmente nem é lembrada em grande parte das Igrejas herdeiras da Reforma e suas descendentes.

Não há vitrinas enfeitadas, não há Papais Noel pelas ruas, não há cartões de boas-festas nem campanhas de solidariedade com os pobres, não há político sorridente prometendo mundos e fundos (especialmente pedindo ou roubando fundos) para o próximo ano. A festa da Epifania é discreta, tão discreta quanto aquele casal que, na periferia de Belém da Judeia, estava às voltas com um parto de emergência, numa estrebaria. A festa da Epifania não foi poluída pelo consumismo, nem pela necessidade de manifestar gestos de solidariedade temporária que assola as pessoas no tempo do Natal, mas terminam em Janeiro, retornando-se à vida sem sentido do cotidiano consumista...

É por isso que não mando votos de Feliz Natal, isso para mim não faz sentido. As pessoas curtem o Natal consumindo e brincando de bom coração, solidariedade, essas coisas que o mundo capitalista esqueceu. Natal para mim é uma missa, celebrando o nascimento de Cristo - a Encarnação celebramos em 25 de março, Festa da Anunciação. Nesse dia renovo em meu coração os votos de solidariedade, serviço, e testemunho que assumi desde o Batismo, confirmados na Crisma e renovados de forma exponencial ao receber as Sagradas Ordens de Diácono e Sacerdote na Igreja de Cristo; e entrego de coração o presente da minha amizade aos meus amigos e amigas leais, um presente que não se compra com cartão de crédito, nem entra em liquidação depois do Natal].

É bem verdade que, pelo interior do Brasil, ainda existem as Folias de Reis e seus assemelhados culturais, e na cabeça das pessoas ainda há uma leve referência ao Dia dos Reis Magos. Puro folclore, herança cultural e colonial de Portugal e Espanha. Nesse caso é uma festa estranha, porque se celebram reis que não existiram. Pelo menos, Mateus não diz que eram reis, mas que eram magos...

Magos, homens (e mulheres!) de antiga sabedoria, de conhecimentos raros sobre o Cosmos e sobre a Natureza . Pagãos, mas não ateus... Pessoas que tinham não só conhecimento, mas sensibilidade afinada para perceber que Deus está agindo e há sinais de novidade nos céus:  “... vimos sua estrela no oriente e viemos para adorá-lo”!

A Epifania é exatamente isso: a manifestação de Deus, a manifestação de Sua Presença, sem os alardes da publicidade, longe dos Palácios e Estádios, sem ufanismo orgulhoso, presunçoso, arrogante e pernóstico. Na simplicidade do cotidiano, na mesmice do dia-a-dia. O Kairós que acontece no Cronos, sem interferir no Cronos, mas Kairós perceptível para quem tem a mente e o coração abertos para perceber o que, de tão evidente, se torna imperceptível: a Presença discreta na fragilidade de um recém-nascido; uma Estrela que pouco se destaca entre as milhares do céu noturno, só percebida pela vista acostumada a mirar e a contemplar o Mistério da Criação.

É este espírito de Epifania que deveria reger a vida da Igreja de Cristo, ministério de serviço, comunhão, anúncio e testemunho; a Igreja de Cristo, que deveria ser constituída pelas pessoas que são capazes de conviver solidariamente com os diferentes, deveria ser um mundo muito maior que a formalidade denominacional, um mundo eclesial além do eclesiástico, um mundo de intercâmbios e interações constantes, de solidariedade: diakonia (serviço), koinonia(comunhão) e martyria (testemunho).

Que 2010 seja um ano feliz para todos e todas vocês, um ano em que a comunhão seja fortalecida, a partilha seja maior e a esperança seja uma certeza de horizonte factível. Que possamos reconhecer a estrela do Menino-Senhor entre tantas estrelas que povoam nosso céu tropical... para que adoremos e sirvamos fielmente ao Deus da Vida através do serviço e da solidariedade a todas as Suas criaturas, especialmente àquelas que foram criadas à Sua Imagem, segundo a Sua Semelhança (Gênesis 1. 26-27).

Que o Capital Insaciável, o Consumismo Diabólico, o Individualismo Globalizado, a Racionalidade Pervertida, não nos fechem esses horizontes em definitivo!

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3 de jan. de 2010

Confissões de Lúcifer !!!

Recebi por e-mail, como texto anônimo, não sei de quem é a autoria, mas é uma reflexão interessante!

CONFISSÕES DE LÚCIFER

Depois de passar 6.000 anos vagueando pela Terra, aprendi muito da natureza humana, suas fraquezas, virtudes e seus desejos mais secretos. Tenho consciência que minha causa foi derrotada, entretanto estou trabalhando freneticamente para levar ao destino que me aguarda o maior número possível de pessoas, pois sei que pouco tempo me resta [1].

Não é fácil a vida de um adversário do Todo Poderoso, principalmente porque Ele conta com um exército fiel espalhado pelo mundo inteiro que com suas orações produzem uma reviravolta em todo mal que intento. Felizmente são poucos os que oram de verdade, porque a maioria está mais preocupada consigo mesma, outros começam bem, me incomodam, mas logo desistem, pois não têm perseverança.

Fico admirado com o fascínio que exerço sobre alguns crentes, que falam mais de mim que de Deus. Rio muito quando eles tentam me amarrar, e dizem que naquela cidade eu não entro mais. Pois acaba a oração e eu continuo fazendo as mesmas estripulias. O que esses cristãos não entendem é que não devem lutar contra mim, mas buscar Aquele que tem mais poder que eu. Quando eu quase destruí a vida de Jó, ele não me dirigiu uma palavra sequer, mas dizia o tempo todo que sua causa estava diante de Deus, e que o seu Redentor vive. Quando humilhei Paulo colocando-lhe um espinho na carne, ele não tentou me acorrentar, mas apresentou sua fraqueza a Deus, que lhe deu vitória. Sinceramente, com gente assim não dá pra lutar.

Tenho prazer especial em atormentar esses que ficam preocupados comigo o dia todo. Eles dizem que me vêem em todos os lugares, até onde eu nem estou.... é muito engraçado. Com tais eu nem me previno, pois sei que são cristãos inseguros da fé que dizem possuir. Eles fazem parte daquele grupo que faz uma boa propaganda de mim, pois julgam que possuo muito mais poder do que realmente tenho e afirmam que fiz coisas das quais nada tive a ver.

Na verdade, eu sou um pobre diabo, condenado e derrotado, mas da forma que falam, é como seu fosse onisciente e onipotente. Será que eles não sabem que eu não posso fazer absolutamente nada sem a permissão do Todo Poderoso? Ah, se não fosse por Ele... mas, tudo bem, a propaganda é a alma do negócio.

Sou constantemente acusado de tirar muita gente da igreja. É mentira! Eles saem por que são levados pelos seus próprios interesses. Não fui eu quem instigou o filho pródigo a sair da casa do pai [2] e Demas abandonou o apóstolo Paulo porque amou mais o mundo do que a Deus [3].

Não tenho pretensão de tirar ninguém da igreja, pelo contrário. Quero deixá-los lá, pois farei de tudo para que sejam frios, apáticos, que fiquem brigando entre si por bobagem, que se dividam, e façam panelinhas entre eles. No que depender de mim farei com que tenham uma vida tão miserável, que quando forem evangelizar ninguém vai querer ter uma vida igual a deles. Outra estratégia que uso muito é a de fazer com que os valores da igreja se pareçam cada vez mais com o mundo, pois assim quando as pessoas passarem a freqüentá-la, elas não precisarão mudar nada, e continuarão fazendo as mesmas coisas de antes. Não é genial?

Adoro soprar mentiras nos ouvidos das pessoas, afinal quero fazer jus ao meu nome de "pai da mentira". É, eu digo-lhes que são como gafanhotos e eles acreditam, digo-lhes que são uns derrotados e eles nem se levantam da cama, digo-lhes que Deus não os perdoou por tal e tal pecado e eles ficam cheios de culpa.

Confesso também que sinto um enorme prazer em oprimir aqueles que se recusam a perdoar ao seu irmão, pois recebi carta branca do Todo Poderoso para atormentá-los com toda sorte de espíritos malignos [4], dos quais eu sou o principal. E não ponham a culpa em mim, pois só posso fazer isso se o cristão recusar a liberar perdão, pois quando ele perdoa é horrível a sensação de paz daquele coração, e eu saio correndo dali.

Acho muito engraçado quando usam sal grosso e oração forte contra mim. Nem ligo. Agora, o que eu temo mesmo é uma vida santificada. Contra um crente santificado, fiel e que tem a Palavra guardada no coração, desse eu fujo [5].

Como minha hora se aproxima eu estou trabalhando num projeto grandioso para este século. É uma estratégia tão ardilosa que são poucos os que a percebem. Todos buscam uma divindade para adorar, por isso eu estou dando "Deus" de todos os tipos e para todos os gostos. Eu estou enchendo o mundo de "Deus" para que eles fiquem tão confundidos que não saibam quem é o verdadeiro. Cada um pode ter o seu, do jeito que quiser. Vocês não imaginam como o povo gosta dessas novidades. Tenho queimado as pestanas inventando sacrifícios, novos rituais, e tenho levantado líderes que falam muito de Jesus, mas são meus súditos. Adoro soprar ventos de doutrinas porque os meninos na fé acreditam em tudo.

O meu objetivo com isso? Confundi-los e fazê-los imaginar que estão servindo a Deus. Agora, eu não aceito levar a culpa de tudo sozinho - eu só dou o que eles querem. Eles gostam do brilho, eles buscam glória pra si, eles crêem em todas as formas de misticismo, e eu nunca imaginei que esse povo gostasse tanto de ídolos. Séculos atrás lhes dei um bezerro de ouro, mas agora eles querem ídolos que cantam, que pregam, que profetizam.

Muitos falam que eu sou feio, e até pintam quadros horríveis dizendo que eu tenho chifres, pêlos e cara de bode. Desde a minha criação sou muito vaidoso e jamais aceitaria ser desta forma. Se vocês ouvissem aquele tal apóstolo Paulo saberiam como eu sou de verdade - sempre fui um anjo de luz, fala mansa, voz agradável, boa aparência e muito convincente [6]. Felizmente são poucos os que me reconhecem.

Para terminar, eu quero dizer a todos que não sou ateu ou agnóstico. Eu creio e tremo diante de Deus [7]. Mas eu não consigo, não consigo me submeter. Submissão significa obediência, e eu não quero ser servo. Aliás, tem muita gente indo comigo que também crê em Deus, pratica seus atos religiosos, freqüenta igreja, e é dessa mesma opinião.

Notas:



[1] Ap 12.12
[2] Lc 15.12
[3] 2Tm 4.10
[4] Mt 18.34-35
[5] Tg 4.7
[6] 2Co 11.14
[7]Tg 2.19

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