Embora o quadro seja trágico, há lampejos de esperança e de mudança no horizonte, como sempre houve na História da Igreja. Dentro das instituições, cada nova geração traz em si a possibilidade de repensar os modelos existentes.
Como sempre, há quem se sente
“fora do padrão estabelecido” e propõe alternativas. É a antiga (e eterna)
dialética entre movimento e instituição; e por isso, se percebe que o movimento
não morreu, mas continua lutando dentro e fora das instituições.
Apresentarei a seguir, e nas próximas postagens, algumas das possibilidades que vejo para a mudança de paradigmas de Missão,
1. A Tradição
Um dos baluartes de
resistência institucional (e isso não vale apenas para as instituições
religiosas) é a “defesa da Tradição”. Mas, o que é, realmente, “tradição”?
Tomo liberdade de citar um
texto meu, datado de 2011:
“Tradição é aquilo que herdamos dos nossos ancestrais
(não confundir com antepassados)
e nos dá identidade, é o que nos
diferencia dentro da sociedade humana como um todo. É o conjunto
mítico-simbólico, conceitual, ético, estético, cultural, que dá senso de
identidade e significado às práticas de um grupo. A Tradição é como uma Arca do Tesouro, onde
as joias estão guardadas e não precisam ser usadas todas ao mesmo tempo. É a
reserva de significado e de identidade. Tradição é aquilo que recebemos dos
ancestrais, das gerações anteriores, colocamos
nossas marcas e passamos adiante às
próximas gerações. Tradição, portanto, é um processo dinâmico que permanentemente se ressignifica
e se reorganiza sem perder seu vínculo histórico. Todo entendimento da
Tradição como algo estático e imutável é, na verdade, idolatria da Tradição, um
tipo de fundamentalismo e, como todo fundamentalismo, estéril e sem vida.”[1]
Ou seja: tradição não é mera
repetição de conceitos e “verdades”, mas afirmação de valores éticos de
identidade! Não é afirmação de processos ou procedimentos, mas de valores
afirmativos da identidade, dentro de um contexto histórico, social e
político bem determinado. Portanto, a tradição sempre carece de uma exegese em
cada geração, para que seja liberta dos paradigmas acumulados que a congelam.
Só a dinâmica do Movimento é
capaz de fazer isso, e – ao fazê-lo – liberta a própria Instituição. Assim, entendo que precisamos abandonar os paradigmas da
Cristandade e retornar ao modelo da Igreja Primitiva, contextualizando-o ao
presente momento histórico.
=/=
Nota: este texto, assim como os três anteriores, é parte de um artigo maior sobre Missão, ainda em fase de elaboração neste momento.
[1]
Teixeira, Luiz Caetano Grecco
- Comunicação do Secretário Diocesano sobre o estado da Igreja. Documento
apresentado à 70ª Reunião do Concílio da Diocese Anglicana do Rio de Janeiro,
Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, realizado em Petrópolis, RJ, agosto de 2011,
disponível em
https://drive.google.com/file/d/17DevF4Y1y-hr3C77PL3hoNG2xOkyR4B/view?usp=sharing
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Salve, Mestre! Continua o picadinho! Gostei da sua forma de explicar o que é Tradição. Como bom anglicano, você não precisa seguir uma dogmática imperativa, ou seja, uma Confissão de Fé que define sua identidade, além do que vocês denominam Quadrilátero de Lambeth (que é simples e aberto à interpretações - dai a diversidade dentro do anglicanismo). Mas os Católicos Romanos têm no Magistério da Igreja a sua Tradição; nós Luteranos, temos nossa Confissão e os Catecismos; no caso Luterano, há uma abertura para a crítica e questionamento dessa base dogmática. Às vezes eu sinto vontade de ser anglicano, hehehe. Beijão.
ResponderExcluirEntão, companheiro. A gente aceita alemães também rsrsrsrs
ExcluirCaro colega. Admiro muito as suas posições e lamento não ter a coragem de afirmá-las publicamente, pois sou dependente da instituição. Li o documento referido neste texto: datado de 2011, é brutalmente atual! Não sou da mesma diocese que você, e fico imaginando o que a leitura do documento provocou no plenário, mas acho que nada aconteceu! Na minha imaginação, houve silêncio ou poucas palavras de apoio ou rejeição. Infelizmente, vozes proféticas como as suas, Rev. Caetano, incomodam desde reis até o chefe da equipe de cozinha (rsrsrsrs). Parabéns! Sua voz representa muitos na Igreja, mas que por comodismo ou covardia, ficam calados. Um fraterno abraço do teu colega de ministério há mais de 20 anos.
ResponderExcluirObrigado. Amigo, como anglicanos não precisamos temer em deixar claro nossos posicionamentos. Aquele documento começou a ter efeitos alguns anos depois... novas gerações chegando. De uma forma ou de outra, ainda somos uma Igreja onde o livre pensar não é proibido, mas parte do nosso ethos. Abraços!
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