21 de dez. de 2012

O Fim do Mundo (2)

andre_mansur_fim_do_mundoEstava tudo bem planejado, o cronograma definido para o mega evento.

O Calendário Maia estava bem aferido, testado que foi pela NASA que comparou os átomos de carbono e os isótopos 14, e dava uma margem de erro de 0,004 nano segundos. Em vários países do Hemisfério Norte cidadãos abastados construíram abrigos subterrâneos enganados pela falsa propaganda que garantia a sobrevivência em caso do mundo acabar (o que é uma asneira, pois acabando o mundo acabam também os abrigos subterrâneos, mas como novos ricos geralmente são idiotas e compram qualquer merda, um monte deles comprou abrigos subterrâneos). Apóstolos, super-evangelistas, mega-pastores, e outros picaretas do tipo, encheram o bucho de dinheiro fácil vendendo passes de salvação para os incautos de sempre.

Após uma ferrenha concorrência, a cidade do Rio de Janeiro foi escolhida para sediar o Grande Impacto que daria início ao fim-do-mundo. A Prefeitura do Rio, com apoio do Governo do Estado e do Governo Federal (afinal alianças políticas servem para essas coisas) construiu três fim-do-mundródomos, porque várias pendengas judicias impetradas por diferentes grupos de interesse, determinavam que o evento deveria acontecer em locais diferentes.

Setores ligados à FIFA e à CNBB (um acordão envolvendo a bancada evangélica em off) impetraram mandato de segurança para que o evento acontecesse no novíssimo Maracanã (cujo projeto final foi aprovado pela Sagrada Comissão Ecumênica da Volta de Jesus); todavia, outros mandatos de segurança e liminares determinavam que seria em frente ao Copacabana Palace onde ficariam hospedadas as autoridades mundiais que celebrariam o acordo internacional do fim-do-mundo, perdoando as dívidas externas de todos os países, inclusive a dos EUA, uma vez que sendo o fim-do-mundo ninguém ia pagar mesmo e se pagassem, os que recebessem não teriam onde gastar; esse era o Projeto Original da Prefeitura que contaria com o patrocínio exclusivo da Petrobrás, do Eike Batista e do Bradesco (o Banco  oficial do Fim-do-Mudo). 

Um terceiro grupo, liderado pelo lobby das Escolas de Samba exigia que o evento acontecesse na Praça da Apoteose após o desfile da União Geral de Grêmios Recreativos e Escolas de Samba do Rio de Janeiro (um mega desfile juntando todas as escolas de todos os grupos); esse grupo tinha o apoio de vários ministros do STF, que alegando o excesso de trabalho devido ao Mensalão, não pode julgar tudo que estava rolando sobre o fim-do-mundo; assim até dia 15 de dezembro, não estava judicialmente decidido o local do impacto.

Para não perder a oportunidade política, a Presidenta da República consultou o Ministério da Ciência e Tecnologia sobre a possibilidade de se conseguir mais dois asteroides, de forma que o evento aconteceria nos três locais  simultaneamente, e seria assim um evento popular onde todos poderiam participar; a Presidenta assinou Medida Provisória definindo recursos para que o INPE providenciasse dois asteroides em caráter de urgência urgentíssima em benefício do interesse público. Todavia, graças a rápida manobra política, a Oposição conseguiu  bloquear a MP no Congresso alegando que os recursos extraordinários fariam falta aos setores de saúde e educação do país; para garantir, os Partidos de Oposição, com a cobertura da mídia empresarial, impetraram mandato de segurança no STF, apesar das explicações do Ministro Presidente do Egrégio Tribunal informar que o Mandato só poderia ser apreciado pela Casa duas semanas ou três após o fim-do-mundo.

Fora do Brasil, na ONU, com a Assembleia Geral reunida, povos de outras culturas e religiões contestavam, através de seus diplomatas, a realização do fim-do-mundo em um país cristão, uma vez que ninguém além dos cristãos esperam a volta de Jesus, e que isso não poderia ser imposto; assim, o mundo não poderia acabar com a volta de Jesus pois seria uma afronta aos povos de outros credos. O representante dos EUA informou que seu país não vai tolerar ingerências terroristas no fim-do-mundo e já colocou todo seu aparato militar em prontidão de alerta laranja, pronto para invadir qualquer país que se oponha ao fim-do-mundo na forma que foi definida, a fim de garantir a liberdade e a democracia mundial mesmo no fim-do-mundo.

Grupos ativistas de todas as cores, do mundo inteiro, especialmente ambientalistas e promotores dos direitos humanos, decidiram realizar um fim-do-mundo alternativo, que aconteceria no Aterro do Flamengo, com o slogan “Um outro fim-do-mundo é possível!”, determinando que o mundo terminaria não por um impacto de asteroide, que danificaria o meio ambiente, mas de forma bem natural, convocando a humanidade inteira e todos os animais a darem um tremendo peido coletivo à hora marcada, alterando rapidamente a atmosfera para o mundo acabar pela falta momentânea de oxigênio, o qual seria rapidamente reposto pelos vegetais em menos de dois séculos através da fotossíntese. O Peido do Novo Mundo foi estampado em camisetas, bandeiras, cartazes… e foram distribuídos à toda humanidade feijões pretos, repolhos e bata-doce, a fim de garantir o evento.

Apesar desses contratempos todos, o Governo Brasileiro garantiu o fim-do-mundo oficial no dia e hora marcada.

De fato, à hora prevista, no dia 21 de dezembro, três enormes asteroides entram na atmosfera da terra, mas se desintegram em poucos segundos, dando como resultado um miserável chuvisco de meteoros, que mal foi visto devido à intensa luz do sol. As autoridades no Copacabana Palace mantiveram o sorriso cínico como se nada realmente tivesse acontecido (e realmente, nada aconteceu). 

No Maracanã, para disfarçar, organizou-se um joguinho amistoso entre Corinthians e Flamengo com as bênçãos do Papa  (que daria a Bênção Final Urbi et Orbi no centro do gramado); enquanto isso, na Praça da Apoteose, terminado o desfile, e nada tendo acontecido, uma briga entre as baterias animou o pessoal sendo que até o momento em que escrevo essas linhas, o pau continua comendo solto por lá.

No Aterro do Flamengo, todavia, o Fim-do-Mundo alternativo também não deu certo: não conseguiram sincronizar o horário do Grande Peido Mundial, de forma que uns peidaram muito cedo, outros mais tarde mas isso não foi suficiente, e ainda tem gente peidando pelo mundo todo…

A Globo, pouco depois do fracasso dos asteroides, colocou no ar o Boal, com as chamadas para o Big Brother Brasil e o Jornal Hoje informou que a CIA suspeita que terroristas albaneses conseguiram danificar o asteroide oficial quando ainda estava por trás da Lua, por isso ele falhou, mas não emitiu nenhum parecer sobre a falha dos dois asteroides brasileiros  extras. Seja como for, uma frota norte-americana estacionou no litoral da Albânia, e logo em seguida o Iran anunciou seu apoio ao valente povo albanês.

No elevador do Copacabana Palace, a Primeira Ministra Alemã comenta com o Rei da Suécia: “Eu bem avisei àquela senhora Dilma que encomendar asteroides chineses não era a coisa mais adequada, mas eles ganharam a concorrência e deu no que deu!”.

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3 de dez. de 2012

Quando não havia o videoteipe, nem o Jô.

Indio da TupyNo final dos anos 50 e início dos 60 do século passado, a TV brasileira engatinhava. Não havia videoteipe, tudo era feito “ao vivo e em preto&branco” e a improvisação era a grande arte! Não havia a baixaria dos programas religiosos, claro.

Lembro que as propagandas eram feitas em estúdio, com uma moça, chamada garota propaganda, apresentando os produtos. Essas moças pagavam muito mico: ela mostrava o novíssimo liquidificador Arno e picava banana, maçã, colocava leite, mostrava como era “fácil fazer uma deliciosa vitamina de frutas”; então girava o botão para ligar o incrível equipamento e nada acontecia! Ela dava um sorriso, girava o botão de novo. Sempre sorrindo, ela tenta novamente, nada! então aparece um sujeito por trás da cena e liga alguma coisa na tomada, era o liquidificador que não estava “plugado”. E então o aparelho começava a funcionar e a tampa saia fora e a pobre “garota propaganda” tomava um banho de vitamina! A imagem saia do ar, entrava o indiozinho da Tupi. Eu me dobrava de rir! Outra vez, a moça estava mostrando um incrível sofá-cama, grande novidade. Ela vai mostrar como é fácil armar a cama, ergue o assento do sofá, o dito cujo escorrega para trás, derruba a parede do cenário, uma confusão danada, novamente a imagem sai do ar e aparece o indiozinho…

Capitão 7

A garotada se amarrava nas Aventuras do Capitão 7, que passava na TV Record de São Paulo, o Canal 7 , onde também havia um programa que a gente curtia muito às 6 horas da tarde: Pullman Junior e depois a Turma dos 7. O Capitão 7 era o nosso super-herói, e fazia sucesso ao lado do Vigilante Rodoviário.  Legal mesmo era o Pullman Junior: crianças se inscreviam para participar, e ficavam lá comendo bolo Pullman, tomando Guaraná Antártica e vendo desenho animado. Uma vez eu participei junto com meu irmão Ricardo. Mamãe ficou dias tentando pelo telefone a nossa inscrição (telefone naquela época era mais complicado que celular da TIM). Conseguiu, era um programa especial de carnaval e fomos fantasiados de palhaço, eu e o Ricardo (nós havíamos ganho um prémio de originalidade no baile infantil naqueles dias, e mamãe estava orgulhosa das fantasias que ela mesma havia confeccionado!).

Chegamos na TV Record, que ficava pertinho do longínquo Aeroporto de Congonhas, e era simplesmente um conjunto de barracões cheios de divisões internas (os funcionários chamavam de estúdios!). Logo na entrada, um saguão, estavam três senhoras sentadas conversando. Reconheci uma delas rapidamente, era a esposa do Palhaço Pimentinha, que era companheiro do Arrelia, no Circo do Arrelia. Essa senhora era uma espécie de faz tudo: atuava no circo, fazia às vezes de garota propaganda, fazia número em programas que tinham de apresentar pequenos auditórios, etc. Ela olhou para mim e disse: “Olha só, se ele fosse magrinho, seria igual ao Pimentinha!” e todo mundo caiu na gargalhada, eu fiquei vermelho de vergonha! Fomos para o estúdio do Pullman Junior e foi quando descobri que era apenas um canto, onde haviam algumas mesas, um monte de criança sentada nas mesas comendo bolo; a gente mal podia ver o desenho animado, porque a televisão ficava por trás. Havia uma menina que apresentava o programa naquele tempo, acho que era a Débora Duarte!!! ela veio me entrevistar e eu fiquei todo orgulhoso: eu estava falando com a Débora, a menina que perturbava meus colegas de ginásio!!! eu tinha 11 anos!

TURMA DOS SETEFoi ai que alguém da TV Record me achou! Havia um programa muito legal, chamado Turma dos Sete, as aventuras de sete crianças, amigos e vizinhos. Um desse personagens se chamava Bolão e era gordinho. O menino que fazia papel de Bolão estava já muito “velho” para o elenco e estavam procurando outros. O sujeito que se apresentou como Produtor da Record gostou de mim… minha mãe, claro, ficou toda cheia de si, e lá foi o Luiz Caetano fazer semanas de testes, decorar texto, até que finalmente eu fui ao ar!!! Putz! Minha mãe passou dias no telefone avisando todos os parentes, inclusive os primos de segundo, terceiro e quarto grau, as vizinhas das cunhadas das primas, etc. que o Luiz Caetano ia estrear na TV no dia tal, ia ser o Bolão da Turma dos Sete, e claro, “ele tem talento, eu sempre soube disso, está muito bem e o diretor gosta muito dele!”. Pobre mamãe! como toda senhora jovem pequeno-burguesa vivia das fantasias do mercado…

Dona Renata, mamãe, deve ter elevado muito o Ibope da Turma do Sete naquele dia, se isso já existisse. Naquele tempo não tinha FACEBOOK, nem Twitter, então não tinha como “compartilhar”, o negócio era telefonar pra todo mundo mesmo. Não tinha videoteipe. A gente entrava no ar e a coisa tinha de rolar na marra! se saísse errado, a gente tinha de improvisar… era divertido!

Durou pouco meu tempo de TV. Meu pai cismou, no que foi plenamente apoiado pelo Diretor do Colégio Nossa Senhora da Glória, o Irmão Expedito Leão (Marista), que aquele negócio de trabalhar na TV e estudar não dava certo. E com seu jeito de pai mansinho, ele convenceu minha mãe e eu simplesmente tive de deixar o programa. Acho que fiz uns três programas, estava em fase de teste ainda.

Por isso é que o Lima Duarte, o Francisco Cuoco e o Tarcísio Meira fizeram sucesso! Meu pai bloqueou minha carreira na TV!!! mas tive meus dias de glória na telinha! e nem precisei escrever livro, virar presidente de qualquer coisa, nem pagar para aparecer no Jô para isso! E ainda ganhei uma graninha, que meu pai usou para comprar minha bicicleta Caloi aro 24, com a qual eu finalmente ganhei do Marcelo (que tinha uma Monark aro 24) nas corridas de bicicleta que a criançada da vizinhança fazia na Jackson de Figueiredo, bairro da Aclimação, São Paulo.

Se naquela época tivesse o FACEBOOK eu teria compartilhado com amigos, grupos, páginas, etc.  É o modesto charme da burguesia!  e vamo que vamo!

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