Desde pequeno o céu me fascina, especialmente o céu noturno, com as estrelas, a Lua e outras estrelinhas mais brilhantes que meu pai dizia serem os planetas Marte, Júpiter, Saturno.
Quando completei 9 anos, meus pais me deram de presente um telescópio para amadores. Era um telescópio mesmo, tipo Newton, daqueles que refletem a luz em um espelho parabólico dentro de um tubo e a ocular fica de lado. Assim surgiu minha vocação para a Ciência e para a Contemplação!
Todas as noites, na “varanda do andar de cima” da casa onde morava , no bairro da Aclimação em São Paulo, eu ficava até tarde “pesquisando” o céu. Logo aprendi a localizar os planetas e as principais constelações. Meu pai me levava, nos finais de semana, ao Planetário do Parque do Ibirapuera, e eu curtia muito tudo aquilo. Esse contato desde menino com o céu, mais as boas conversas com meu avô Caetano, matemático e professor, me levaram pelos caminhos da ciência.
Quando vovô Caetano faleceu, eu tinha oito anos! mas eu já conseguia jogar xadrez (com a grande ajuda do tio Ricardo e do meu pai) e entendia um bocado daquilo que, depois, soube ser a Teoria de Conjuntos – meu avô fez parte da geração de matemáticos italianos que trabalhou com G. Peano no desenvolvimento da nova linguagem para a Álgebra e a Teoria de Conjuntos. Através de intrigantes conversas, muitas estórias, joguinhos e brincadeiras, vovô me mostrou a beleza da Matemática.
Quando fiz 10 anos, fui estudar no Glória (Colégio Nossa Senhora da Glória, dos Maristas), no bairro do Cambuci e lá três professores, o Irmão Deodoro, o Irmão Demétrio e o Irmão Celso Félix, concluíram esse processo de aproximação da ciência ao mesmo tempo que testemunhavam sua fé em Cristo através da devoção à Virgem Maria.
Na puberdade, as aulas de Matemática e Ciências do Irmão Demétrio e do Irmão Deodoro, me deixavam maravilhado e em atitude quase contemplativa diante das maravilhas da natureza. Foi o Irmão Deodoro, em sua especial maneira de ensinar com simplicidade, quem primeiro me apresentou Darwin e a Teoria da Evolução, enquanto o Irmão Demétrio me introduzia no estudo da Álgebra e da Análise com muita animação. “Matemática é fácil”, esse era o lema repetido no início de cada uma de suas aulas. Eu curtia o meu telescópio com alguns colegas de noite e usávamos a Geometria do Irmão Demétrio para desenhar nossos mapas do céu!!!
O Irmão Celso Felix, por sua vez, nas aulas de Português e Literatura nos incentivava a escrever e defender nossas ideias nas seções literárias do Grêmio Estudantil, onde também a gente era iniciado na política! Tudo isso, antes de eu completar 14 anos! Haviam debates sobre todos os assuntos, desde fábulas de Esopo (cada uma com a famosa “moral da estória”) até as notícias sobre política, economia e ciência.
Lembro que minha primeira vitória em um fórum de debates foi que eu consegui provar que as abelhas não são “melhores” que as formigas! Consegui que a banca de jurados declarasse empate numa disputa entre as formigas (tidas como animais daninhos) e as abelhas (animais úteis, na ingênua classificação do livrinho que tivemos de ler). Eu fui o único aluno da classe que aceitou defender as formigas contra o grupo de defensores das abelhas! (como vocês podem ver, vem desde menino essa minha maluquice de abraçar causas complicadas!). E, como testemunhou o Irmão Deodoro, usei muito do que havíamos estudado nas aulas de Ciências sobre insetos…
Esses três homens, Irmãos Maristas, professores por vocação e por voto religioso, são até hoje minhas grandes referências tanto no Magistério (que exerci por 20 anos) quanto na capacidade de contemplar a natureza com os olhos da Ciência e com o coração da Fé, embora minha conversão real ao senhorio de Cristo tenha acontecido em um contexto ecumênico, muitos anos depois do convívio com eles – mas permanece até hoje o carinho especial pela Mãe de Deus.
É claro que guardo no coração um sentimento de reconhecimento e carinho por Dona Eliete, Dona Vilma, Dona Teresinha, Dona Aurea e Dona Margarida, minhas professoras no primário, com quem aprendi a leitura, e dei os primeiros passos nas sendas da Aritmética, da Geografia, da História, e das Ciências Naturais… elas despertaram em minha mente a curiosidade e a vontade de saber e de pensar! Naquele tempo Professora era tratada por “Dona” e por Senhora, não era parente da gente! E ninguém da minha turma ficou cheio de traumas por isso…
Terminei o ginásio em 1964, no ano do primeiro golpe militar. Fui estudar no São Luís e depois no Bandeirantes. Quatro anos depois veio o segundo golpe, com o AI-5, o Decreto Lei 477 e outras coisinhas diabólicas, mudando o rumo da sociedade e liquidando com a educação brasileira através do acordo MEC-USAID e da famigerada Lei de Diretrizes e Bases 5692 (1970). Escapei por um triz dos novos currículos escolares para o segundo grau, cujo estrago só vim perceber quando, anos depois, comecei meu segundo curso universitário e peguei calouros (de)formados de acordo com os conceitos da 5692… Gastei dois dos quatro anos do curso superior em Matemática revendo o que eu tinha aprendido no Científico, pois segundo os meus docentes, o currículo do segundo grau fora reduzido e muita coisa passou para o currículo universitário (exceto nos colégios militares!!!).
Apesar dos tempos complicados, o curso Científico (sei lá o que vem a ser hoje, acho que Secundário – mudam os nomes e baixam a qualidade) definitivamente me encaminhou para a Ciência e me colocou em cheio no Movimento Estudantil, que sofria violenta repressão da Ditadura.
Alguns professores foram decisivos: Prof. Vitor Eisemann (Trigonometria), Prof. Carlos Cattoni (Geometria), Dr. Fragoso e Profa. Geovana Albanese (Física – fui reprovado duas vezes!), Áurea (Química Geral e Atomística – meu primeiro contato com a Mecânica Quântica), Prof. Manoel Pereira do Valle (Português e Literatura Geral), Prof. Morivaldo (Psicologia Geral) e outros cujos nomes minha pouca memória perdeu, mas seus semblantes ainda estão vivos na minha mente com as belas aulas que ministraram: Álgebra, Físico-Química, Física Experimental, Química Experimental, Química Orgânica, Biologia Geral, Genética, Bioquímica… pois é, a gente estudava isso tudo no Científico, mesmo nas Escolas Públicas, que eram de alta qualidade… naquele tempo não haviam os “cursinhos”, e o vestibular não era de marcar “X”…
Todas essas pessoas, professoras e professores, cooperaram com meus pais para que eu fosse o que sou, de bom e de ruim. Devo a eles minha formação como pesquisador, estudioso da Ciência, e pela capacidade de elaborar uma reflexão crítica e coerente.
Poderia ainda falar dos meus professores dos tempos da universidade e então a lista ficaria bem maior (Milton Damato, Henrique Panzarelli, Jaci Maraschin, Ruben Alves, Glauco Soares de Lima, Sumio Takatsu, Marilena Chauí, Ubiratã Dorival Diniz, et alli). Todavia, quero nesta homenagem memorial, lembrar dos meus Mestres Iniciadores, a quem tratávamos por Senhor e Senhora (e eles também nos tratavam assim!!!), ficávamos em pé quando entravam na sala de aula, eram severos conosco (fui reprovado duas vezes em Física e uma em Matemática - fiz o segundo Científico três vezes!!!), mas tinham um senso de humanidade e de responsabilidade que são raros hoje em dia, quando a professora virou “tia” e os docentes são chamados de “cara”!
A todos, elas e eles, inclusive o vovô Caetano, papai e mamãe, que descobriram minha vocação científica, apresento meu reconhecimento e minha gratidão. Rendo Ação de Graças a Deus pela existência dessas pessoas em minha vida!
Nota: eu devia ter publicado isso dia 15 de outubro, mas por razões diversas, não fiz. Porém, a Física Relativista e a Mecânica Quântica, ambas comecei a aprender com alguns deles, mostram – assim como a Fé – que o tempo é apenas um conceito que não se aplica uniformemente no Universo… então, que seja dia 15 de outubro agora ou quando a gente quiser – todo dia é dia para a gente mostrar carinho e gratidão!
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